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Tudo o que voc� queria saber sobre
a direita – e vai continuar n�o sabendo

Olavo de Carvalho
O Globo, caderno Prosa & Verso, 22 de setembro de 2000

 

O leitor sabe quem s�o von Mises, Hayek, Rothbard, Kirk, Muggeridge, Horowitz, Sowell, Babbit, Scruton, Peyrefitte, Jouvenel, Voegelin, Gu�non, Nasr, Schuon, Lindblom, Rosenstock-Huessy, Rosenzweig, Kristol? Se perguntar a um direitista culto, ele lhe dir�: S�o os principais pensadores de direita do s�culo XX. Mas, se procurar os seus nomes na lista de verbetes deste "Dicion�rio Cr�tico do Pensamento de Direita", n�o os encontrar�. Em lugar deles, topar� com uma lista de tarados, psicopatas, esquisit�es, assassinos e genocidas -- de R�hm a Eichmann --, muitos deles de identidade ideol�gica incerta, al�m de autores de terceira ordem e personagens de import�ncia epis�dica. De escritores significativos, s� os mais enfezados e at�picos, como Charles Maurras, que terminou excomungado por um papa conservador, e Ezra Pound, cujos escritos pol�ticos ningu�m leu e que o pr�prio autor do verbete s� conhece por refer�ncia indireta. Dos direitistas normais sobraram apenas Ortega, Pareto, Schmitt, Michels, Mosca, Heidegger, Gentile e Burke, al�m de alguns brasileiros. Em compensa��o, h� verbetes sobre Walt Disney, cuja �nica contribui��o ao "pensamento de direita" foi delatar uns agentes comunistas, sobre Eleonora Duse, da qual s� n�o se pode dizer que n�o deu nada porque foi amante de um direitista, e sobre Monica Lewinsky, que para a direita s� deu assunto.

Se voc� quer saber o que � a direita, n�o h� de ser aqui que vai obter uma resposta. Mas, se quer saber o que a esquerda deseja que voc� imagine que a direita �, ent�o, amigo, este � o livro para voc�. Devore estas p�ginas em que 120 professores torraram o melhor de seus neur�nios e uma substancial verba de pesquisa, e sair� ignorando tudo o que � preciso ignorar para passar de ano na escolinha de militantes em que se transformou a universidade brasileira.

� verdade que o Dicion�rio come�a com uma introdu��o onde o organizador mostra n�o ignorar o assunto de todo. Mas, se ele sabe o que � conservadorismo, ent�o por que permite tanto esfor�o, no resto do livro, para confundi-lo com fascismo e nazismo, que tiveram contra si as mais poderosas for�as conservadoras da modernidade, o "establishment" norte-americano e o Imp�rio Brit�nico? De 282 verbetes, 67 s�o sobre nazismo -- a quarta parte do livro, sem uma men��o sequer ao fato de que eminentes conservadores julgam o nazismo um movimento de esquerda. Especialmente �til para consolidar a no��o falsa � a profus�o de verbetes sobre anti-semitismo, todos omitindo que esse fen�meno nada tem de essencialmente direitista, j� que endossado por Karl Marx e praticado abundantemente na URSS.

Um "dicion�rio do pensamento de esquerda" que, omitindo a maioria dos autores essenciais, ao mesmo tempo enfatizasse os cem milh�es de mortos, o Gulag, os Processos de Moscou e o trabalho escravo que construiu as economias da URSS e da China, mesmo sem faltar com a verdade nos detalhes, seria considerado pura propaganda direitista e n�o mereceria coment�rio. Mas este � propaganda enganosa, que atribui � direita pecados not�rios da esquerda, como por exemplo a pol�tica racial norte-americana que fortalece as identidades dos grupos separados, incentivando o orgulho e a divis�o.

As 460 p�ginas do livro, divididas pelo n�mero de autores, resultam em menos de quatro para cada um, seguidas de indica��es bibliogr�ficas que raramente ultrapassam o total de cinco t�tulos e quase nunca se reportam a textos originais. N�o obstante, o organizador proclama que redigi-las custou quatro anos de trabalho e n�o poderia ter sido feito sem o aux�lio financeiro de tr�s institui��es patrocinadoras. Espero, pelo bem da reputa��o intelectual da equipe, que isso n�o seja verdade.

O que n�o se pode negar � que se trata de obra original: este �, nos anais da hist�ria editorial, o primeiro livro dedicado a um dos autores que o subscrevem.