Mensagem do sr. Fedeli, atrav�s de um seu menino-de-recados
Carta aberta de um ex-aluno a Olavo de Carvalho, sobre sua gnose Felipe Coelho
Enquanto meu professor, Orlando Fedeli, n�o comenta o �ltimo protesto do Sr. Olavo de Carvalho contra a den�ncia de sua gnose, eu, Felipe Coelho, Cat�lico, ex-aluno deste �ltimo, comentarei brevemente alguns pontos de sua tentativa de resposta, entitulada "Mais um golpe de teatro do charlat�o Orlando Fedeli". O texto do Prof. Orlando Fedeli, como o pr�prio t�tulo indica, n�o trata apenas do Sr. Olavo de Carvalho, mas tamb�m de Ren� Gu�non, de modo que o Sr. Olavo n�o deveria ter ficado t�o lisonjeado com sua extens�o. O que o Prof. Fedeli de fato fez foi aproveitar a deixa para dar uma mini-aula de gnose, a partir dos "quatro itens da gnose" do "Aviso 2" do Sr. Olavo, com o objetivo principal de esclarecimento dos alunos deste que porventura sejam ou possam vir a ser Cat�licos.
Acrescente-se ainda uma cita��o do pr�prio Sr. Olavo de Carvalho corroborando este procedimento: "N�o discuti com eles em meu livro nem vou faz�-lo agora, porque vigarice (intelectual ou qualquer outra) � coisa que n�o se discute: vigarice se denuncia, e pronto" (Olavo de Carvalho, "Por uma Esquerda Melhorzinha", in O Imbecil Coletivo, 2� ed., Rio de Janeiro, Faculdade da Cidade, p. 390). Foi o que fez o Prof. Fedeli: desafiado, denunciou e provou a gnose de Gu�non e Carvalho. Chegamos assim ao cerne da quest�o: afinal, do que o Sr. Olavo de Carvalho est� sendo acusado? � �bvio que n�o � de ser um seguidor das doutrinas de Valentino, Bas�lides, do gnosticismo dos primeiros s�culos.
O pr�prio estudo do Prof. Fedeli mostra a gnose presente no sufismo, na cabala, no hindu�smo, e em v�rios autores de diversas origens apontados pelo Sr. Olavo como grandes homens espirituais, ficando claro portanto que a acusa��o n�o � de pregar a heresia crist� dos primeiros s�culos.
A insist�ncia do Sr. Olavo neste ponto t�o evidente � no m�nimo estranha. � �bvio tamb�m que n�o se trata de "gnose" como mero sin�nimo de "conhecimento", pois neste caso n�o haveria raz�o para se utilizar o primeiro termo em vez do segundo.
A gnose de que o Sr. Olavo de Carvalho � acusado � uma modalidade de conhecimento espec�fica: trata-se da doutrina her�tica do conhecimento direto e unitivo de Deus pelo homem - ou melhor, por aquilo que haveria de divino no interior do homem -, realizado por meio de uma intui��o que eliminaria a distin��o entre sujeito cognoscente e objeto conhecido - entre o homem, o mundo e Deus -, pois no fundo s� Deus existe, e tudo que h� de individual � ilus�rio. � absurdo o Sr. Olavo querer dizer que Santa Teresa tinha este tipo de conhecimento de Deus quando lhe aparecia Nosso Senhor. � claro que, ao v�-Lo, ela permanecia Teresa, e Ele, Jesus.
Quanto ao dem�nio, conhece apenas a exist�ncia de Deus, n�o sua ess�ncia, e como se viu acima � justamente a ess�ncia de Deus que os gn�sticos pretendem conhecer.
Quanto � salva��o, o Sr. Olavo de Carvalho disse recentemente: "Isso n�o quer dizer que o Papa esteja errado ao afirmar que o cristianismo � a �nica via de salva��o. Como poderia estar errado, se o conceito mesmo de 'via de salva��o' n�o se aplica ao Isl� ou ao juda�smo?" (Olavo de Carvalho, "Mensagem de Natal", O Globo, 23.12.2001). Das duas uma: ou o Sr. Olavo aqui admite que, n�o sendo vias de salva��o, o maometismo e o juda�smo levam ao inferno, e neste caso seria Cat�lico; ou ent�o, como � evidente, o Sr. Olavo adere a uma escatologia n�o-Cat�lica e gn�stica, e defende tamb�m a doutrina de que nem todos precisam ser salvos, que a salva��o n�o exige uma f� determinada e certa, pois bastaria o conhecimento. E isso � gnose.
Ali�s, Frithjof Schuon, que at� muito recentemente o Sr. Olavo de Carvalho considerava "homem espiritual de primeiro plano e formulador do �nico m�todo v�lido j� concebido para a compara��o e aproxima��o das religi�es" (in O Jardim das Afli��es, 2� ed., � Realiza��es, S�o Paulo, 2000, p. 308),
trata a f� exatamente como o Sr. Olavo, como caminho para a gnose: "A F� n�o poder� opor-se ao Conhecimento [de Deus, ou seja, a gnose] da qual �, ao contr�rio, como vimos, um modo inici�tico..." (Frithjof Schuon, Da Unidade Transcendente das Religi�es, Trad. Fernando Guedes Galv�o, Livraria Martins Editora S.A., S�o Paulo, 1953, p. 184).
E, sobre a natureza do conhecimento gn�stico, o mesmo autor afirma: "Acrescentamos que no ponto de vista inici�tico esta vis�o [a Vis�o Beat�fica] pode, e deve at�, obter-se ainda nesta vida..." (ibid., p. 179). E ainda: "...at� existem m�todos para obter esta gra�a que equivale, em suma, a uma 'concretiza��o' da 'vis�o beat�fica'." (ibid., p. 157). (O Sr. Olavo deve lembrar-se de ter lido isto, pois, no par�grafo anterior a este �ltimo trecho citado, encontra-se detalhada por Schuon a compara��o blasfema entre a Virgem Maria e Maom� que o Sr. Olavo resumiu em seu artigo "Mensagem de Natal", O Globo, 23.12.2000). Registre-se ainda que, como tudo isso � condenado pela Igreja Cat�lica, Schuon refere-se a Ela com total desprezo: "A Igreja latina, com seu idealismo sentimental e irrealista..." (Frithjof Schuon, O Esoterismo como Princ�pio e como Caminho, Ed. Pensamento, p. 189).
Continuando, � not�vel que o Sr. Olavo de Carvalho confesse aqui n�o renegar nada do que escreveu antes de 1995, com exce��o de seu artigo sobre a "gnose de Princeton". Isto significa que n�o renega o artigo citado pelo Prof. Fedeli em que ap�ia as doutrinas defendidas por Gu�non em O Demiurgo (Cf. Olavo de Carvalho, "O Homem e sua lanterna. Ren� Gu�non o Mestre da Tradi��o contra o Reino da Deturpa��o", in Revista Planeta, n� 107, agosto de 1981, p. 17), doutrinas estas que se enquadram at� naqueles seus quatro itens da gnose, feitos para mascarar a sua pr�pria gnose. Afinal, o Sr. Olavo de Carvalho confessa mais uma vez que � gn�stico. Abaixo vai o texto do Prof. Fedeli, seguido da mais atual confiss�o do Sr. Olavo de Carvalho, ao coment�-lo (o sublinhado � meu): "At� hoje, ele afirma que h� algo superior � f� e �s cren�as de todas as religi�es - a 'Tradi��o' primordial - n�cleo comum a todas elas. Esse n�cleo ele mesmo o chamou de Gnose. E � esse suposto n�cleo que permite a ele dizer-se, ao mesmo tempo, cat�lico-judeu-isl�mico." At� aqui o Prof. Orlando Fedeli. A seguir, a nova confiss�o de gnose de Olavo de Carvalho: "A exist�ncia desse n�cleo n�o � uma doutrina: � um simples fato emp�rico, fac�limo de comprovar (cf. Whitall N. Perry, A Treasury of Traditional Wisdom, Pates Manor, Bedfont, Perennial Books, v�rias edi��es). Cham�-lo gnose, tradi��o, sabedoria perene, filosofia perene ou qualquer outra coisa � absolutamente indiferente. Todo homem que, al�m de conhecer esse fato, admita a veracidade intr�nseca e essencial do referido n�cleo de princ�pios � um �gn�stico�, no sentido lato em que porventura caiba chamar-me assim, e por isto mesmo n�o pode ser um gn�stico no sentido espec�fico em que o sr. Fedeli me acusa de s�-lo, de vez que a heresia gn�stica, por seu dualismo e sua revolta promet�ica contra a ordem divina, nega frontalmente esses mesmos princ�pios." Como j� se viu, � precisamente da gnose que o Sr. Olavo reconhece defender, e n�o da heresia dos primeiros s�culos, que o Prof. Orlando Fedeli o acusa. Ademais, j� foi demonstrado pelo Prof.� Fedeli que todos os especialistas no assunto consideram o gnosticismo (a heresia dos primeiros s�culos) uma esp�cie do g�nero gnose (substrato ou n�cleo de v�rias heresias). O argumento do Sr. Olavo para negar este fato e defender a "boa gnose", por meio da alega��o de que o gnosticismo seja um "falso conhecimento", � semelhante ao argumento dos comunistas -- que o Sr. Olavo de Carvalho tanto condena, e faz bem de condenar -- ao afirmarem que o "verdadeiro comunismo" permanece bom ap�s as experi�ncias genocidas de St�lin, L�nin, Mao e cia., pois estas seriam "falso comunismo"...
O Sr. Olavo de Carvalho citou recentemente Hans Jonas como "o mais famoso historiador da gnose", numa breve nota na qual fala em "o r�tulo de gnose (no sentido estrito de Hans Jonas)" (Olavo de Carvalho, nota a "A face oculta do mundialismo verde", de Pascal Bernardin, in </convidados/bernardin2.htm>). Logo, o Sr. Olavo aceita que Hans Jonas usa gnose no sentido estrito, sentido que � condenado pela Doutrina Cat�lica. Veja-se ent�o o que diz Hans Jonas: "Na verdade, houve apenas alguns grupos cujos membros se denominaram expressamente 'gn�sticos', 'os que conhecem'; mas j� Sto. Irineu, no t�tulo de sua obra, usou o nome 'gnose' (com o acr�scimo de 'falsamente chamada assim') para abranger todas as seitas que compartilhavam com eles esta �nfase [no conhecimento como meio de obter a salva��o ou ele mesmo como forma de salva��o] e certas outras caracter�sticas.
Neste sentido podemos falar de escolas, seitas e cultos gn�sticos, de escritos e ensinamentos gn�sticos, de mitos e especula��es gn�sticas, e mesmo de uma religi�o gn�stica em geral. Seguindo o exemplo dos autores antigos que primeiro extenderam o nome [gnose] para al�m da autocomposi��o de alguns grupos, n�o somos obrigados a parar onde parou seu conhecimento ou interesse pol�mico, e podemos tratar o termo como um conceito classificat�rio, que se aplica onde quer que as propriedades definidoras estejam presentes." (Hans Jonas, The Gnostic Religion, 2nd edition, Beacon Press, Boston, 1991, p. 32, sublinhados meus).
N�o s� os especialistas, mas tamb�m o j� citado Frithjof Schuon, que faz a mesma distin��o entre gnose e gnosticismo, admite que o gnosticismo pode ser chamado validamente de gnose -- e da gnose que defende! -- conforme cita-o o Prof. Fedeli em seu trabalho: �Se n�s n�o 'reduzimos' o sentido da palavra [Gnose] a este sincretismo, n�s admitimos entretanto que, de toda evid�ncia e por raz�es hist�ricas, que se chamem de 'gn�sticos' tamb�m os hereges designados convencionalmente por esse termo� (F. Schuon, Comprendre l�Islam, Ed. du Seuil, Paris, 1976, p. 137, nota 1; apud Orlando Fedeli, A Gnose "Tradicionalista" de Ren� Gu�non e Olavo de Carvalho, in <http://www.montfort.org.br/cadernos/guenon.html>).
Ao mesmo tempo em que agora tenta se desvencilhar de Schuon, o Sr. Olavo de Carvalho aponta a obra principal de Whittal N. Perry como probante da doutrina her�tica do n�cleo comum das religi�es, que seria a "boa gnose". Justo este livro de Perry que o editor da revista gu�noniana Symbolos, ao resenh�-lo, diz ser nada menos que "una especie de biblia schuoniana"! (Cf. Federico Gonz�lez, in <http://personal5.iddeo.es/jmrio/libfg26.htm>). E ainda acrescenta: "Este libro es tomado como una enciclopedia casi sagrada de sabidur�a por los estudiantes schuonianos de habla inglesa. (...) Sin entrar en la vida privada de nadie diremos que el mismo M. Koslow se�ala a Perry como el colaborador directo de Schuon y a su esposa como �ntimamente allegada a su familia, con quien todo lo comparten; por lo que deben ser considerados como sus portavoces autorizados o los asociados m�s �ntimos del suizo; incluso viven en casas vecinas." A� est�: Perry � porta-voz de Schuon, e o trabalho citado pelo Sr. Olavo como evid�ncia para seu "ecumenismo radical" � nada menos que uma "b�blia schu�nica". Al�m disso, o pr�prio nome da editora do livro de Perry, Perennial Books, � significativo e mostra sua liga��o com a seita "perenialista" de Schuon. Acrescente-se ainda que o mesmo Perry afirma que este seu livro foi inspirado no desejo de Ananda Coomaraswamy, amigo de Gu�non, de um dia ter uma suma do pensamento gn�stico, obviamente para se contrapor � Suma Teol�gica, de S. Tom�s, pilar da Igreja Cat�lica.
Finalmente, o Sr. Olavo cita dois pretensos erros do Prof. Fedeli, que supostamente trocaria o sujeito de suas frases. Vejamos. No primeiro caso, Olavo afirma: "Digo, por exemplo, que com tal ou qual argumento ele 'cortou seu pr�prio pesco�o' - e ele entende que eu estou amea�ando cortar o seu pesco�o". Ora, em seu "Aviso 1" Olavo dissera: "Por enquanto, n�o h� mal em que o sr. Fedeli v� curtindo sua ilus�o de ser um novo S. Jer�nimo, de ter cortado a l�ngua a um infiel (sic). Logo ele ver� que cortou mais � seu pr�prio pesco�o". E isso n�o � uma amea�a? Se eu digo a algu�m: "Voc�, ao me acusar, assinou sua pr�pria senten�a de morte", n�o o estou amea�ando? Por favor.
E veja-se que o Sr. Olavo, em seu "Aviso 2", diz ainda que a den�ncia do Prof. Fedeli "n�o habilita o sr. Fedeli a receber outra resposta sen�o uma que o C�digo Penal me pro�be: um tapa na cara". Para piorar, o segundo "erro" consegue ser ainda mais tolo, pois o Sr. Olavo afirma: "Digo que seus alunos est�o assustados e perplexos - e ele entende que o estou acusando, a ele, de assustar os meus alunos". Reparem bem que foi exatamente isso que o Sr. Olavo disse em seu "Aviso 3" (os negritos e o sublinhado s�o meus): "Respondi �s suas acusa��es, de fato, n�o por m�rito delas ou de seu autor, mas apenas em aten��o a dois ou tr�s garotos que, sendo alunos dele, tamb�m s�o meus, e que enquanto o forem ter�o o direito de obter de mim, na medida em que eu possa d�-las, as explica��es necess�rias a tir�-los do estado de perplexidade e confus�o em que tipos como o sr. Fedeli os jogam para domin�-los."
De qualquer forma, isto � uma quest�o de pouca import�ncia; fundamental � que ficou provado que o Sr. Olavo de Carvalho n�o � Cat�lico, nem judeu, nem mu�ulmano. � gn�stico. Diante da qualidade de seus argumentos, n�o surpreende que o Sr. Olavo encha sua "defesa" de "adjetivos" ao Prof. Orlando Fedeli. A mim, quanto mais o Sr. Olavo de Carvalho desce o n�vel da discuss�o, mais lamento ter sido um dia seu aluno. �������In Iesu et Maria, �������Felipe Coelho. �������12.07.2001
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