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O Irracional Superior

Olavo de Carvalho
�poca, 10 de fevereiro de 2001

 

Tal personagem j� est� entre n�s. Converse dois minutos com ele e emburre para sempre.

 

Outro dia perguntei a um festejado jornalista brasileiro o que ele achava de algo que eu tinha lido num determinado livro e obtive a seguinte resposta: �Nunca ouvi falar e acho que n�o tem o menor fundamento�.

Desde que entrei mais ativamente na arena dos combates jornal�sticos, em 1995, quase 100% das obje��es que tenho encontrado assumem a forma desse argumento: �Eu n�o sei do que voc� est� falando, logo voc� est� errado�.

Em l�gica, isso se chama argumentum ad ignorantiam: deduzir, do pr�prio desconhecimento de uma coisa, a inexist�ncia da coisa. � uma das formas elementares de sofisma, e o que me espanta � que ela tenha adquirido, para a mentalidade dos brasileiros falantes, tanta autoridade e tanta credibilidade.

A premissa dessa atitude mental �, evidentemente, a mais insustent�vel que se pode imaginar: �Eu sei tudo (logo, o que eu desconhe�o n�o existe)�. O sujeito que raciocina nessa base tem um dogmatismo pueril e autoconfiante que chega a ser comovente em sua total candura. � verdade que, no uso di�rio, o sofisma aparece disfar�ado sob a forma de um �entimema�, isto �, de um silogismo com premissa oculta: o sujeito faz uma elipse mental, saltando direto do sentimento de surpresa para a nega��o perempt�ria da novidade repulsiva, sem se dar conta do pressuposto l�gico que embasa sua conclus�o. Ele n�o �, pois, conscientemente dogm�tico. Mas, em vez de atenuar a gravidade do erro, isso s� p�e em relevo uma prodigiosa inconsci�ncia. Como um homem pode proclamar uma conclus�o com tanta seguran�a sem nem perceber a premissa imediata que a fundamenta? Tamb�m � verdade que meus objetores pertencem em geral a um mesmo grupo social, pelo qual n�o se poderia avaliar a intelig�ncia dos demais brasileiros: o grupo dos intelectuais esquerdistas e das pessoas afetadas, de algum modo, pela linguagem deles. N�o me surpreende que esse grupo re�na o grosso do contingente de cretinos e incapazes, pois as formas direitistas de cretinice sa�ram da moda e reflu�ram para o circuito fechado dos grupelhos pseudo-esot�ricos que vivem de uma inofensiva auto-adora��o.

Ap�s estudar o assunto por tr�s d�cadas e meia, j� cheguei � conclus�o de que o esquerdismo n�o � nem sequer uma ideologia: � apenas uma forma de inconsci�ncia patol�gica, um escotoma intelectual (e moral) adquirido por v�cio e covardia. A experi�ncia j� me mostrou que, em circunst�ncias normais, � ut�pico esperar de um militante esquerdista qualquer exerc�cio da intelig�ncia al�m do estritamente necess�rio para manter aquecidos os sentimentos grupais que o unem a seus pares numa esp�cie de fus�o m�stica. Na verdade, isso � mais que uma observa��o pessoal: � uma conclus�o cient�fica do psiquiatra Joseph Gabel em Ideologies and the corruption of thought (London, Transaction Publishers, 1997), em que ele completa as investiga��es que come�ou em 1962 (que creio j� ter mencionado nesses artigos) sobre a identidade de estrutura l�gica entre o discurso socialista (e nacional-socialista) e o del�rio esquizofr�nico.

Mas o que � espantoso, sim, � a velocidade com que as pessoas adquirem essa patologia mediante nada mais que uma exposi��o breve e superficial ao linguajar esquerdista. Aos 14, aos 13 anos, um estudante brasileiro j� est� preso, paralisado, petrificado na cren�a de que qualquer fato novo que pare�a contrariar seu sentimento de estar do lado dos bons contra os maus deve ser negado no ato, sem a m�nima averigua��o. Ou na melhor das hip�teses neutralizado mediante alguma combina��o verbal de improviso que lhe d� uma interpreta��o totalmente diversa. Essa gente est� espiritualmente morta, intelectualmente castrada j� no ingresso da adolesc�ncia. S�o meninos tacanhos, prematuramente endurecidos, lacrados no fundo de um po�o seco, em cuja escurid�o cr�em enxergar, por proje��o inversa, a imagem de um futuro radiante.