Efeitos da 'grande marcha'
Olavo de Carvalho
A Justi�a Eleitoral existe, como o pr�prio nome o diz, para que as elei��es sejam justas. Mas ela se comp�e de funcion�rios p�blicos e, desde que apareceu neste pa�s um fen�meno chamado "a grande marcha da esquerda para dentro do aparelho de Estado", essa classe vem se tornando cada vez mais suspeita de estar interessada em tudo, menos em elei��es justas. Pois a "grande marcha" consiste em ocupar o maior n�mero de empregos p�blicos, com a finalidade de colocar o aparelho de Estado a servi�o de um partido, o qual ent�o passa a exercer o governo sem ser governo, desfrutando das prerrogativas do poder sem as suas concomitantes responsabilidades. Essa opera��o foi calculada por seu inventor, Antonio Gramsci, para ser realizada de maneira lenta e sorrateira, de modo que os pr�prios governantes acabem sendo responsabilizados pelos efeitos globais nefastos das a��es de funcion�rios infiltrados na burocracia para desmoraliz�-lo e enfraquec�-lo. Um exemplo da efic�cia alucinante desse procedimento foi obtido j� durante o governo militar. O regime, por ser autorit�rio e n�o totalit�rio, desejava a apatia pol�tica do povo e n�o fez nenhum esfor�o para doutrin�-lo segundo os valores do movimento de 1964 (o totalitarismo, ao contr�rio, exige doutrina��o maci�a). Essa atitude deixou � merc� da oposi��o de esquerda a rede de instrumentos editoriais, jornal�sticos e escolares de forma��o da opini�o p�blica (o que, entre outras coisas, resultou na amplia��o formid�vel do mercado de livros esquerdistas). Uma das poucas tentativas de doutrina��o feitas pelos militares foi a introdu��o, nas escolas, das aulas de "Educa��o Moral e C�vica". Mas t�o displicente foi essa tentativa que o Partido Comunista se aproveitou da oportunidade para lotar de bem treinados agitadores as c�tedras da nova disciplina, as quais assim se tornaram uma rede de propaganda comunista subsidiada pelo governo. � claro que muitos professores ideologicamente descomprometidos tamb�m se apresentaram para suprir as vagas, mas os militantes faziam o mesmo como tarefa partid�ria, de modo que, no conjunto, o plano comunista de apropriar-se dos rec�m-abertos canais de doutrina��o n�o concorreu com uma premedita��o igual de signo ideol�gico contr�rio, mas apenas com a resist�ncia amorfa de uma massa politicamente indiferente e sem dire��o. A brutal politiza��o marxista das escolas, que hoje culmina nas barbaridades ideol�gicas impingidas �s crian�as pelos manuais publicados pelo pr�prio Minist�rio da Educa��o, come�ou precisamente a�. O mais not�vel foi que, ocupado em reprimir a guerrilha, o governo militar n�o apenas deu r�dea solta � ala "pac�fica" e gramsciana da esquerda, mas at� lhe concedeu substanciais incentivos. O principal editor comunista da �poca jamais deixou de receber subs�dios oficiais, at� que, com a abertura pol�tica, come�ou a ter dificuldades financeiras e acabou vendendo sua empresa. Jamais interrompida, rarissimamente denunciada, a "grande marcha" parece enfim ter chegado � Justi�a Eleitoral, que, nos �ltimos tempos, tomou pelo menos tr�s decis�es bastante suspeitas. Primeiro, proibiu men��es adversas � alian�a do PT com o movimento "gay" (v. meu artigo no JT de 20 de setembro); depois, mandou distribuir cartazes que incentivavam o eleitor a votar "para mudar", o que � mensagem de signo ideol�gico indiscutivelmente n�tido; por fim, vetou propagandas do candidato do PPB � Prefeitura de S�o Paulo que apresentavam sua concorrente como adepta da causa abortista uma afirma��o cuja veracidade � empiricamente confirm�vel por qualquer um. Cada uma dessas decis�es, isoladamente, pesa pouco. Somadas se ainda n�o vierem outras , talvez n�o sejam capazes de decidir uma elei��o. Mas, na escala minimalista de uma estrat�gia que aposta antes na somat�ria de milhares de a��es impercept�veis do que nos riscos da propaganda espetacular, elas v�m engrossar o caudal da "revolu��o cultural" gramsciana, a muta��o sutil e persistente dos padr�es de percep��o do povo brasileiro, cujos resultados, em S�o Paulo e em outras cidades importantes, j� est�o em vias de se traduzir em resultados eleitorais superficialmente limpos e profundamente sujos. � imposs�vel n�o ver simultaneamente um efeito da "grande marcha" na greve da pol�cia pernambucana, claramente ilegal e insurrecional, e em mil e um outros fatos que parecem isolados, mas cuja origem comum est� sempre num funcionalismo p�blico bem adestrado para trabalhar contra quem paga seu sal�rio.
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