A previsão e a franga
Olavo de Carvalho
O petismo do governo ga�cho tem sido apontado como uma imagem do Brasil futuro. Mas que Brasil ser� esse? Quem est� fora do Rio Grande n�o tem a menor id�ia do que se passa por l�. Como saber se a previs�o � promessa ou amea�a? Algumas informa��es recentes talvez ajudem. O diretor do jornal "Zero Hora", Nelson Sirotsky, falando para uma plat�ia de duzentas pessoas na Associa��o da Classe M�dia de Porto Alegre, confirmou que o governo Ol�vio Dutra vem usando das verbas de publicidade oficial para limitar o exerc�cio da liberdade de express�o no seu Estado. Ele citou o exemplo dos pequenos jornais que, por debilidade financeira, se rendem ao PT para n�o perder an�ncios. Poderia tamb�m ter mencionado os jornalistas Pol�bio Braga, H�lio Gama, Gilberto Sim�es Pires e outros, que informam ter sido removidos de suas tribunas por press�o do governo. Sim�es Pires, um dos comentaristas mais populares da TV local, al�m de perder o emprego est� sendo processado porque, exibindo uma foto na qual o governador e sua secret�ria da Educa��o, entre bandeiras vermelhas, posavam ao lado de escolares que faziam a tradicional sauda��o do punho cerrado, disse que se tratava de uso de crian�as para propaganda de uma ideologia violenta -- conclus�o irrefut�vel, mas, ao que parece, proibida. Quem conhe�a o estilo da ret�rica esquerdista, um caldeir�o fervente onde termos como "canalha", "ladr�o" e "vendido" borbulham em profus�o, pode se espantar de que pessoas t�o grosseiras no falar tenham ouvidos t�o sens�veis e berrem de dor ante a simples conclus�o de um silogismo. Mas comunistas s�o mesmo assim: eles podem imputar a voc� os piores crimes, mas se voc� os chama simplesmente de atrasados, de ignorantes -- ou de comunistas, o que d� na mesma --, eles entram em estado de choque. Recentemente um professor da USP, c�lebre pelas acusa��es cabeludas que faz ao presidente da Rep�blica, ouvindo dizer que este chamara a esquerda de "burra" saiu exclamando que se tratava de... tem�vel investida contra a liberdade de express�o. � o que os americanos chamam "overreact" -- a marca inconfund�vel do fingimento histeriforme, sinal de iminente ruptura esquizofr�nica da consci�ncia. Para dar uma id�ia de at� que ponto esse mal afeta a nossa esquerda, basta mais um epis�dio, que n�o tem nada a ver com o caso do Rio Grande, mas que ajuda a compreend�-lo. Na semana passada escrevi aqui que a libera��o dos v�cios era um item essencial da ideologia esquerdista (como na verdade j� o era no tempo do "Flower Power" que, desde os campos de Woodstock, tanto ajudou os comunistas a dominar o Vietn� e a transform�-lo no gueto de terror e mis�ria que ele � hoje). Pois bem: um professor da UFRJ, em resposta, me enviou um e-mail enfurecido, amea�ando me processar porque eu "dissera que todos os jovens socialistas usam maconha e coca�na" e porque ele e seu filho, ambos socialistas, agora acreditavam enxergar, nos olhares de seus colegas, insinua��es p�rfidas que os acusavam de maconheiros e cocain�manos. O racioc�nio do cidad�o consistia em partir de uma premissa mentirosa e deduzir dela, por saltos l�gicos assombrosos, uma autoriza��o para fantasiar inten��es nas pessoas em torno, um motivo para se sentir v�tima e um pretexto para voltar todo o seu ressentimento insano contra um agressor imagin�rio que, para c�mulo, n�o conhecia nem a ele nem �quelas pessoas. Joseph Gabel, no cl�ssico "La Fausse Conscience", usou exemplos como esse para demonstrar que o racioc�nio das ideologias totalit�rias � id�ntico ao de um del�rio esquizofr�nico. Esse modelo de racioc�nio est� subentendido tanto no temor que os pr�ceres ga�chos t�m dos jornalistas que os observam, quanto, em dose ainda mais expressiva, na mensagem do desvairado professor uf�rjico. Em ambos os casos, trata-se de instrutores de loucura: o Estado paga-lhes para que transmitam a eleitores e alunos o seu padr�o patol�gico de percep��o, para que os incapacitem para a vida adulta, fazendo deles eternos meninos ressentidos que ter�o de se apegar sempre � muleta de algum discurso de inculpa��o projetiva. Mas, voltando aos ga�chos, n�o � s� na imprensa que a liberdade deles sofre restri��es que, se impostas por um governante direitista, suscitariam uma onda nacional de protestos. Um come�o de passeata, promovido por uma organiza��o de mulheres anti-PT, foi cercado por olheiros que, mais que depressa, acionaram as autoridades para que proibissem qualquer nova manifesta��o do grupo, o qual n�o teve rem�dio sen�o voltar �s ruas com morda�as pretas para informar � popula��o, sem dizer nada, que algo de indizivelmente esquisito estava acontecendo. Na mesma linha de esquisitice mal conscientizada, um diretor da estatal ga�cha Emater, em discreta circular � "companheirada" (sic), admite que ali o crit�rio de sele��o � puramente ideol�gico, "como se alinhamento ou ficha no partido fosse garantia de compet�ncia". E ele reclama disso n�o porque a coisa lhe pare�a intrinsecamente imoral, mas porque n�o deu os resultados esperados: "N�o conseguimos a hegemonia", lamenta-se. E sugere, como rem�dio, "ler um pouco mais de Gramsci". Para um governo que nem tem apoio da maioria na assembl�ia, o do Rio Grande tem mostrado uma precipita��o incomum em revelar antes da hora a �ndole ditatorial da ideologia socialista, violando os ensinamentos do mestre da camuflagem, Antonio Gramsci, o Senhor da Moita. Igual afoiteza, por�m, inflamou as meninges do candidato virtual Luiz In�cio Lula da Silva durante sua viagem � Belfort Roxo do Caribe, levando-o a rejeitar em p�blico a cor rosa que a moda analg�sica atribui ao seu partido e a assumir, num rompante, que o neg�cio dele � mesmo o bom e velho comunismo. �Tudo enfim leva a crer que, prematuramente solta, sem medo de ser feliz, a franga vermelha abre as asas sobre n�s.
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