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Di�logo no elevador
Olavo de Carvalho
“O ‘fil�sofo’ Olavo de Carvalho – diz ele – dedicou seu espa�o inteiro no Di�rio do Com�rcio � minha pessoa. Como n�o o dou a mesma import�ncia, n�o pretendo respond�-lo em meu precioso espa�o de O Globo” etc. etc. “Olavo de Carvalho”, na frase, � objeto indireto, requerendo, portanto, o pronome indireto: “n�o lhe dou a mesma import�ncia”. Provando que n�o cometeu a mancada por distra��o, mas por genu�no desconhecimento da concord�ncia pronominal, o autor do trecho reincide no erro j� na ora��o seguinte: “N�o pretendo respond�-lo”, em vez de “responder-lhe”. Se a coisa fosse no Globo, uma providencial editoria de texto salvaria em tempo a reputa��o do articulista, que, no seu blog pessoal, sofre as conseq��ncias fatais de ser deixada aos cuidados dele pr�prio. Ap�s esse come�o triunfal, o sr. Constantino volta � ostenta��o de import�ncia, jurando que mal tem tempo de prestar aten��o � minha insignificante pessoa. No instante em que escrevia isso, ele n�o sabia que essa afeta��o de superior indiferen�a j� estava desmascarada, no meu programa de r�dio, pela sua confiss�o de estar escrevendo n�o um pobre artigo, mas um romance inteiro no qual consto como personagem, sob o nome de “Ot�vio de Ramalho”. Sabendo-se que a cria��o romanesca exige muito mais profundo envolvimento emocional do autor do que a reda��o veloz de um artigo de jornal, n�o � curioso que o sujeitinho indigno de um fugaz olhar jornal�stico seja alvo de t�o lisonjeira aten��o liter�ria? Tudo no mundo tem um pre�o: quem vive de poses e fingimentos sempre acaba, mais dia, menos dia, dando com a l�ngua nos dentes, exibindo aquilo que mais desejaria ocultar. Em seguida, o sr. Constantino revela uma vez mais sua completa ignor�ncia das regras elementares da argumenta��o e da prova, ao alegar que a dedu��o que tirei de uma afirma��o sua (no Youtube) � “um reductio ad absurdum”. Em primeiro lugar, ele n�o deveria usar express�es latinas se n�o sabe latim. Ostenta��o sempre termina em vexame. Reductio � feminino, portanto deve-se escrever “uma reductio” e n�o “um reductio”. Em segundo lugar, a reductio ad absurdum consiste em ir tirando, de uma afirma��o, conseq��ncias cada vez mais amplas e mais remotas, at� chegar a alguma que seja ou pare�a absurda. Foi isso precisamente o que n�o fiz com a senten�a do sr. Constantino. N�o o fiz e at� adverti explicitamente que n�o se deve fazer. O que fiz foi extrair dela a conseq��ncia mais imediata, exigida incontornavelmente pelo pr�prio enunciado da senten�a. O sr. Constantino, com toda a evid�ncia, n�o sabe o que � reductio ad absurdum, termo que ele mal lambeu numa leitura apressada dos meus coment�rios a Schopenhauer e saiu usando para parecer bonito. Vejamos. O sr. Constantino defende a legaliza��o do aborto com base no argumento de que o feto n�o � humano desde a concep��o. O que extra� da� foi a conseq��ncia �bvia de que, se o feto n�o � reconhecido como humano por natureza, portanto desde a concep��o, algu�m ter� de decidir qual o instante em que ele se torna humano, e essa decis�o, para ter valor legal obrigante, s� poder� ser tomada pelo Estado. Logo, de maneira imediata e incontorn�vel, o argumento do sr. Constantino dava ao Estado a prerrogativa de conceder ou negar aos nascituros o estatuto de seres humanos. N�o h� a� nenhuma reductio ad absurdum, pelo fato mesmo de que essa conseq��ncia, em si, n�o � absurda, nem eu jamais disse que fosse. Ela � apenas dif�cil de justificar desde o ponto de vista liberal que � o do sr. Constantino, pois como lutar pela redu��o do poder do Estado quando se concede a ele uma prerrogativa t�o alta, e de t�o vastas conseq��ncias, como a de separar, entre os filhos de seres humanos, os que merecem e os que n�o merecem ser tratados como seres humanos? Ao revoltar-se contra essa conclus�o, bradando que a “coloquei na sua boca”, o sr. Constantino revelou n�o compreender as implica��es mais �bvias e patentes do que diz. Pego de cal�as na m�o, ele se mela num rid�culo maior ainda com uma deplor�vel exibi��o de in�pcia gramatical e falsa cultura. Por fim, provando novamente que n�o sabe mesmo o que � reductio ad absurdum, ele pr�prio, ap�s t�-la condenado como desonesto recurso de er�stica, lan�a m�o dela por sua vez, sem nem em sonhos perceber que o faz, ao proclamar que minha oposi��o ao poder estatal de decretar o come�o da vida humana, se levada �s suas �ltimas conseq��ncias, terminar� por negar ao Estado todo direito de cobrar impostos. Compreende-se que a um debatedor t�o pobre de instrumentos intelectuais n�o reste muita sa�da sen�o apelar, em desespero, � afeta��o de desprezo superior e, � claro, �s infal�veis aspas pejorativas. Da minha parte, n�o me considero suficientemente importante para negar aten��o ao sr. Constantino ou a quem quer que seja. Meu compromisso jornal�stico, de analisar o estado mental das classes influentes com base nas palavras de seus representantes, exige que eu fale de pessoas que, justamente por sua in�pcia presun�osa, se tornam representativas do estado de debacle cultural que desejo expor. Quando me criticam por dar aten��o a quem n�o merece, respondo com o epis�dio em que se encontraram no elevador do Estad�o dois articulistas c�lebres, um comunista, o outro conservador, respectivamente Miguel Urbano Rodrigues e Lenildo Tabosa Pessoa. Lenildo entrou e saudou o colega: – Bom dia! Miguel Urbano, azedo, retrucou: – N�o cumprimento f. da p. Lenildo n�o pestanejou: – Pois �. Mas eu cumprimento. |
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