A coluna de hoje, data venia dos amáveis
leitores, será toda dedicada àquelas criaturas
mimosas que, na ética brasileira vigente, representam
a epítome das virtudes humanas: os comunistas.
Comecemos com uma declaração
célebre de Haydée Santamaria, ícone da
Revolução cubana. A frase circula pela
internet num cartaz de propaganda comunista atribuído
falsamente à Petrobras, mas, se foi escolhida numa
tentativa muito safada de sujar a reputação da
empresa, é porque seu conteúdo é
significativo em si mesmo, e é ele que me interessa
aqui, não o cartaz. A frase é:
"Para mim, ser comunista não é militar
num partido, é ter uma atitude ante a
vida."
Qual atitude, precisamente? A própria
Haydée responde, na mesma carta que contém a
declaração usada pelos falsários (http://www.rebelion.org/argentina/040521haydee.htm):
"Creo que hay que hacer un gran esfuerzo para ser
violenta, para ir a la guerra, pero hay que ser violenta e
ir a la guerra si hay necesidad."
O paralelo com o célebre
"no perder la ternura jamás"
é inevitável. Faz parte da liturgia comunista
o mantra de que os comunistas só matam por
obrigação moral, a contragosto. Pela
lógica da normalidade humana, quem mata a contragosto
tenta reduzir ao mínimo o número de
vítimas. Isso contrasta de maneira acachapante com o
fato de que os comunistas são os campeões
inquestionados do morticínio universal, inclusive na
América Latina, onde os feitos de Fidel Castro
superam incalculavelmente os de seus mais execrados inimigos
direitistas.
Mas, como se conclui facilmente do
que expliquei em artigos anteriores, o movimento
revolucionário moderno não poderia ter-se
originado por inversão do cristianismo sem absorver e
inverter também os seus critérios morais. O
ethos comunista, que as duas sentenças de
Haydée Santamaria (e a apologia guevariana do
guerrilheiro como "eficiente e fria máquina de
matar") exemplificam tão claramente, é a
perfeita inversão do bem e do mal. Antonio Gramsci
já propunha a substituição do
calendário litúrgico da Igreja por um novo
panteão de santos, onde os assassinos a
serviço da revolução ocupariam os
lugares dos mártires cristãos.
O
método para realizar a inversão é uma
tortuosa dialética que faz da truculência
revolucionária a expressão máxima do
bem e da santidade. Essa dialética emerge diretamente
da inversão de tempo e eternidade que aqui expliquei.
Na medida em que identificam o bem eterno com o futuro que
prometem, os comunistas estão livres para matar e
torturar no presente sem poder ser julgados por ele. De
outro lado, como o futuro é indeterminado e só
os próprios comunistas podem oficializar o seu
advento quando ele chegar, o acerto de contas com a moral
fica para o dia de são nunca.
Enquanto
isso, os comunistas deitam e rolam nas delícias da
auto-indulgência, matando, torturando, arrasando
países inteiros, reduzindo multidões a uma
miséria indescritível e, nos intervalos,
retorcendo-se em trejeitos de indignação
contra o pecaminoso capitalismo. Os representantes do
presente maligno não podem julgá-los, e os do
futuro maravilhoso julgam em causa própria,
prevalecendo-se do direito de adiar o julgamento até
o dia da perfeição final, inatingível
por definição. Logo, seus crimes não
lhes podem ser imputados e recaem fatalmente sobre seus
inimigos, isto é, suas vítimas. Daí que
tenham tanto mais intensa impressão de santidade
quanto mais lavam suas mãos no sangue dos outros.
Eles nunca são culpados pelos seus próprios
atos. Puros e santos, são forçados pelo
maldito capitalismo a violar sua bondosa
inclinação natural e sair matando pessoas,
como se fossem assassinos. Esse sacrifício lhes
dói tanto, que quando matam sentem que são
eles próprios as vítimas, em vez de autores do
crime. Daí o ódio redobrado que sentem pelo
falecido que, perfidadamente, os obrigou a torturá-lo
e matá-lo. Daí, mais ainda, a necessidade que
sentem de continuar a matá-lo em efígie
eternamente, xingando-o e difamando-o a cada oportunidade e
negando clemência até mesmo a seus
descendentes. Na Romênia de Ceaucescu o ex-ministro da
economia, Mihail Manoilescu, foi condenado à morte e
executado simbolicamente cinco anos depois de ter morrido na
cadeia. Matá-lo uma vez só não bastava.
São delicadezas da alma comunista que escapam aos
corações insensíveis dos
reacionários.
Ser comunista é ser
um assassino cheio de ternura por si mesmo e de ódio
eterno, inextinguível, às suas vítimas.
Escravos fujões
Graça Salgueiro, minha amiga e editora do
admirável blog Nota Latina (www.notalatina.blogspot.com), me chama a atenção para mais um detalhe
maravilhoso na entrevista do professor-assassino João
Carlos Kfouri Quartim de Moraes que já comentei aqui
e também no Jornal do Brasil (v.
/semana/070206dce.html
e
/semana/070208jb.html).
Fazendo ironia com os fazendeiros do Império que
julgavam a escravatura uma instituição
benévola, afirma o elemento: "Os escravos,
teimando em não compreender as
motivações filantrópicas de seus
proprietários, fugiam em massa das senzalas e das
plantações".
Bem, os escravos
brasileiros não são as únicas pessoas
incompreensivas que fugiram de seus benfeitores. Seis
milhões de cubanos escapuliram de Cuba, expondo-se ao
risco de morrer afogados ou de ser comidos pelos
tubarões caso não fossem metralhados antes
pela polícia de Fidel Castro. Seu exemplo
abominável foi seguido por dois milhões de
vietnamitas que fugiram da generosidade vietcongue em
barquinhos, jangadas e até bóias de borracha.
Algumas dezenas de milhares de alemães mal
agradecidos saltaram o Muro de Berlim para expor-se aos
horrores do capitalismo na parte oeste da cidade. O fluxo de
refugiados da Polônia, da Rússia, da Hungria,
da China e de outros templos da bondade comunista jamais
cessou de superlotar as ruas de Nova York, Paris e Londres e
até de São Paulo, dando testemunho onipresente
da ingratidão humana. E eu mesmo, cínico e
indiferente à ternura que jorra do
coração do prof. Kfouri, fugi para os EUA
antes que desse na veneta filantrópica do indigitado
a idéia de constituir às pressas mais um
tribunal revolucionário e me mandar para o
beleléu como fez com o capitão Charles
Chandler.
História invertida
Uma evidência moral que deveria ser
óbvia à primeira vista é que, se todo
militante nazista é cúmplice moral do
Holocausto, todo militante comunista é
cúmplice moral da matança de cem
milhões de vítimas dos regimes
soviético, chinês, cubano etc. No caso dos
terroristas brasileiros, sua participação no
esquema genocida internacional montado por Fidel Castro
(não menos de quinhentos mil mortos no total) foi
algo mais do que moral: foi cumplicidade material,
através da ajuda que receberam dele e dos
inumeráveis serviços que lhe prestaram. Desde
logo, o fato de que a guerrilha nacional agisse sob a
orientação da OLAS, Organización
Latino-Americana de Solidariedad, é mais que
suficiente para provar que ela não foi uma iniciativa
nacional independente e sim a consecução local
de planos estratégicos traçados pessoalmente
por Fidel Castro. Assim como há uma diferença
entre o vago simpatizante nazista da França ou da
Holanda e o militante efetivo que no exterior cumpria as
ordens emanadas da Chancelaria em Berlim, a mesma
diferença existe entre o mero esquerdista subjetivo e
os nossos guerrilheiros. Como braços armados de Fidel
Castro, eles ajudaram a matar cada cubano que morreu de
tortura ou de fome nos cárceres da ilha e cada
vítima das guerrilhas que o ditador do Caribe
espalhou pelo continente latino-americano e pela
África.
Se compararmos a imensidão
desses feitos macabros com a truculência modesta da
ditadura que os combateu, a superioridade moral desta
última se tornará demasiado evidente. Por isso
a historiografia de propaganda esquerdista que forjou a
imagem desse período na memória nacional
é tão enfática em assinalar os crimes
da ditadura e tão omissa em descrever as
conexões da guerrilha local com o esquema
estratégico cubano e continental. Mesmo quando fala
da Operação Condor, a
articulação de governos militares para o
combate às guerrilhas, ela busca sempre dar a
impressão de que se tratava de uma
conspiração transnacional armada contra
heróicas resistências locais, e não de
um arranjo feito às pressas para enfrentar um esquema
revolucionário internacional muito mais antigo,
organizado e abrangente. A OLAS, afinal, tinha agentes em
todo o mundo e conexões muito fortes na mídia
internacional, enquanto os generais latino-americanos mal
tinham alguns oficiais de relações
públicas, canhestros e mal treinados, para tentar
balbuciar explicações diante de
repórteres maliciosos, intoxicados de
prevenção esquerdista, quando não
militantes comunistas eles próprios.
É por isso que a história da
ingerência dos EUA na situação
política latino-americana da época aparece cem
por cento invertida no relato que as escolas e o movimento
editorial passam às novas gerações. A
força dos documentos históricos é
aí neutralizada por grotescas lendas urbanas criadas
pela propaganda comunista, que se impregnam na
memória popular como verdades de evangelho. Na
crença geral, os EUA continuam aparecendo como
autores ou pelos menos inspiradores do golpe de 1964, embora
a correspondência entre o embaixador Lincoln Gordon e
o presidente Johnson mostre que o governo americano se
limitou a manter-se informado sem interferir em nada.
Inversa e complementarmente, a debilitação e
queda dos governos militares é atribuída
à ação espontânea e
heróica das resistências locais, quando os
documentos provam que foi tudo uma decisão direta do
presidente Jimmy Carter, o pai da prosperidade esquerdista
nas décadas seguintes. Ante a pressão
americana, nossa ditadura teve de se desmantelar às
pressas, abandonando o país nas mãos da
canalha esquerdista que desde então não fez
senão comer dinheiro público, bajular
criminosos e derreter-se em orgasmos de
auto-adoração.
A anistia
jurídica que essa gente recebeu nunca deveria ter
vindo junto com a anistia moral que aboliu a memória
de seus crimes e tornou eternamente imperdoáveis os
de seus adversários. Nem a ditadura foi tão
ruim, nem os comunistas que a combateram o fizeram por amor
à democracia e aos direitos humanos. A alternativa
aos militares, nas décadas de 60 e 70, era exatamente
aquela que a guerrilha trazia em seu bojo: a tirania
comunista, infinitamente mais brutal e sedenta de sangue do
que o mais enfezado dos nossos generais poderia jamais ter
sido. A História nunca é uma escolha entre o
céu e o inferno, a felicidade integral e o
infortúnio absoluto: é uma permanente
opção entre a mediocridade do mal menor e a
santificação psicótica do mal maior.
Nesse sentido, tendo sido radicalmente oposto ao
regime militar enquanto ele durou, hoje não vejo como
condená-lo por inteiro em comparação
com a alternativa hedionda oferecida pelos santarrões
comunistas na época. No mínimo, os presidentes
militares morreram pobres. Morreram pobres porque foram
honestos. E, se perseguiram os comunistas, deixaram o resto
da nação em paz. Hoje, os cidadãos
brasileiros são assassinados à base de
cinqüenta mil por ano enquanto os comunistas se
empanturram de dinheiro público e trocam beijinhos
com a narcoguerrilha colombiana que fomenta a
violência nas ruas do Rio e de São Paulo.
Moralmente, não há comparação
possível.
Diferença abissal
A propósito disso, e com referência
à antologia de meus artigos que está para
ser publicada como edição especial do
Diário do Comércio, creio dever aos
leitores uma explicação pessoal, escrita
desde o fundo do meu coração.
Há uma diferença abissal entre
refutar uma idéia e denunciar um crime. Quando
condeno os jornais e jornalistas que ocultam a
matança de cristãos no mundo, que fingem
acreditar na inexistência ou inocuidade do Foro de
São Paulo, que jamais noticiam os constantes
assassinatos e torturas de prisioneiros políticos
em Cuba, na China e nos países islâmicos (e
quando o fazem é com uma
circunspecção que raia a omissão
completa), não estou discutindo suas
idéias: estou denunciando sua cumplicidade
consciente e obstinada com crimes hediondos. Minha
divergência com eles não é de
crenças, de convicções, de
ideologia: é a diferença moral
irredutível entre o homem sincero e um bando de
mentirosos cínicos.
Do mesmo modo,
não é ideológica a distância
que me separa daqueles que se sentem mártires
porque perderam 376 militantes para a ditadura nacional
enquanto ajudavam Fidel Castro a matar quinhentas mil
pessoas (v.
http://www.cubaarchive.org/english_version) a cujos descendentes a mídia hipócrita
e o governo cão negam toda palavra de consolo.
Ideologia discute-se. Uma diferença abissal de
percepção, de sentimentos, de moralidade,
de senso das proporções, só se
expressa com gritos de horror ou com o silêncio do
desprezo.
Não fui eu que criei essa
diferença. Foram eles. São eles que abrem
um abismo ontológico intransponível entre
os seus e os do partido contrário,
considerando-se detentores exclusivos do estatuto humano
e tratando seus adversários mortos como detritos
na lixeira da História.
A essa
diferença corresponde outra, igualmente
invencível, mas de ordem cognitiva, entre eles e
aqueles que não medem a condição
humana, os direitos humanos, a dignidade da vida humana,
por uma carteirinha de partido.
É do
máximo interesse deles escamotear essa
diferença, fingindo que é tudo mera
divergência de opiniões, para em seguida
choramingar que sou um intolerante, que os maltrato
só porque não pensam como eu. O
número dos que apelam a esse expediente malicioso
é diretamente proporcional à sua falta de
vergonha na cara.
Não vejo como expor
nossa diferença polidamente. Palhaço seria
eu se, diante de tantas condutas criminosas, me pusesse
a discuti-las em tom de debate intelectual, como se
fossem grandes e elevadas teorias, sublimes
hipóteses científicas, arrojadas
especulações filosóficas. Bem sei
que é isso o que querem. Mas eu estaria me
rebaixando ao último grau da indignidade se
fizesse algo para contentá-los.
Nem
falo, é claro, daqueles que diante de provas
tão patentes e superabundantes da mendacidade
esquerdista que impera nos meios de
comunicação deste país, ainda se
queixam de que a mídia nacional é
"conservadora". Se com os primeiros já
não havia a menor possibilidade de
diálogo, esses, então, não merecem
sequer ser mencionados, de raspão, numa conversa
entre pessoas decentes. Seu lugar na escala da
idoneidade profissional é o das amebas e
protozoários na hierarquia animal.
Non raggionam di lor, ma guarda e passa.
Por outro lado, é superlativamente
cínica e de má fé a exigência
de “argumentos” por parte de gente que
sempre respondeu aos meus mediante a mais sórdida
e persistente campanha de difamação de que
algum jornalista brasileiro já foi vítima
ao longo de toda a história nacional. Insultos a
mim e à minha família, ameaças de
morte, imputações criminais escabrosas,
boicotes profissionais ostensivos não contentaram
a sanha dessas criaturas, que em seguida se esmeraram em
distribuir pela internet mensagens falsas em meu
nome, com conteúdo racista e nazista, e em criar
sites inteiros, com conteúdo forjado, para
impingir ao público a farsa de um Olavo de
Carvalho moldado à imagem e semelhança do
ódio e do temor irracionais que o personagem real
lhes inspira.
Só de cartas que
sugerem, pedem, imploram ou exigem sumariamente a minha
exclusão da mídia, tenho as cópias
de várias dezenas – amostragem modesta do
que circulou pelas redações. Como posso
crer que tantos sujeitos empenhadas em tapar minha boca
estejam ao mesmo tempo ansiosos para ouvir meus
argumentos?
Quem tem o direito de cobrar
argumentos sou eu e não eles, como bem lembra
Guilherme Afif Domingos no prefácio à
antologia que mencionei. Mas quem, na esquerda
supostamente letrada, vai querer discutir comigo? Todos
os que o tentaram se saíram muito mal. Seus
descendentes aprenderam a lição. Ao
primeiro sinal de um confronto, fogem esbaforidos, de
medo de que sua vacuidade mental, desprovida das defesas
do cargo e da claque, seja exposta à plena luz do
dia. Preferem ir fazer fofocas bem longe de mim,
protegidos em suas salas de aula, ante alunos
previamente vacinados contra a tentação de
me dar ouvidos. Aí sim, deitam e rolam, dizem de
mim o que querem, fazem piadas, contam garganta e me
derrotam em mil e um embates imaginários.
Os exemplos de baixeza, de covardia, de
mendacidade grupal organizada que vi desde a primeira
edição de O Imbecil Coletivo
(1996) são uma amostragem sociológica mais
que suficiente do perfil moral médio do
esquerdismo falante.
Antes disso eu já conhecia, é
claro, o poder da máquina de
difamação esquerdista. Sabia o que ela
tinha feito com Gilberto Freyre, com Otto Maria
Carpeaux, com Gustavo Corção, com Georges
Bernanos, com José Osvaldo de Meira Penna, com
Antonio Olinto, com Roberto Campos – com um
punhado de homens ilustres. A fúria inventiva que
ela mobiliza contra aqueles a quem quer destruir
não tem limites. Não há mentira,
não há invencionice, não há
intriga, por mais rasteira e porca que seja, a que seus
funcionários não recorram com a cara mais
bisonha do mundo, seguros da indulgência
plenária garantida pela sua superioridade moral
inata, indiscutível, divina. E a tudo isso
denominam "debate intelectual", desfolhando-se
em chiliques de donzela ultrajada quando os chamamos de
delinqüentes camuflados. Minha experiência
pessoal com essa gente só veio a confirmar, com
sobra de evidência, tudo o que a História
me havia ensinado a seu respeito. Hoje entendo que o
esquerdismo não é um ideal, uma
crença, uma filosofia: é uma doença
moral horrível, a substituição do
senso instintivo do bem e do mal por um conjunto de
artifícios lógicos que, por etapas,
vão levando da mera perversão à
inversão completa, à
santificação do mal e à
condenação do bem.