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O estilo Pavlov de governar

Olavo de Carvalho
Jornal da Tarde, 17 de julho de 2003

A dificuldade maior com esse sr. Lula � que a gente tem de trat�-lo ao mesmo tempo com a rever�ncia do cidad�o comum � autoridade presidencial e com a condescend�ncia paterna do adulto letrado para com um rapaz de pouca instru��o.

� preciso lev�-lo totalmente a s�rio, para evitar o risco de ofend�-lo, e n�o lev�-lo a s�rio de maneira alguma, para evitar que suas palavras ofendam nossa intelig�ncia.

Isso deixa qualquer um esquizofr�nico.

Talvez, ali�s, tenha sido essa uma das raz�es para ele ser escolhido candidato � presid�ncia. O c�lebre neurofisiologista Ivan Pavlov demonstrou que a estimula��o contradit�ria repetida � uma "prova��o intoler�vel" (sic) para o c�rebro: ela estupidifica o ouvinte e o predisp�e a aceitar servilmente qualquer ordem ou sugest�o que se lhe d� em seguida, por mais absurda ou prejudicial que seja.

Lula � a estimula��o contradit�ria encarnada.

Pois n�o � que ele acaba de apelar ao mundo para que "exija mais a��o dos EUA em defesa da democracia", ao mesmo tempo em que protestava contra o ataque a Saddam Hussein?

Pode haver a��o mais decisiva em favor da democracia do que desmantelar em duas semanas um regime ditatorial sangrento que j� havia matado, comprovadamente, mais de trezentos mil prisioneiros pol�ticos? Teria constitu�do "mais a��o" deixar a ONU arrastar-se por mais alguns anos em debates e conjeturas enquanto em Bagd� a m�quina de moer gente mantinha sua produtividade m�dia de trinta cad�veres por dia?

E que outra ajuda � democratiza��o universal esperaria dos EUA o nosso presidente? Que aplaudissem o regime de Fidel Castro? Que estimulassem com um empr�stimo milion�rio a escalada ditatorial de Hugo Ch�vez? Que recusassem chamar de terrorista, para n�o magoar inofensivos narcotraficantes, o regime de terror imposto pelas Farc a metade da popula��o colombiana? Que, em suma, agissem � imagem e semelhan�a de Lu�s In�cio Lula da Silva?

E, diante do protesto do presidente da Pol�nia, que lhe lembrava o fato arquiconhecido de que os EUA s�o a �nica pot�ncia internacional que j� fez alguma coisa s�ria para demolir ditaduras no mundo, nosso bisonho governante ainda se queixa de ter sido "mal interpretado"!

Como interpretar uma contradi��o monumental sen�o mostrando que � uma contradi��o monumental? J� ensinava Benedetto Croce: "O erro fala com voz dupla, uma das quais proclama o falso e a outra o desmente; e � um contender de sim e n�o, que se chama contradi��o... O erro condena-se, n�o pela boca do juiz, mas ex ore suo."

Ex ore suo -- por sua pr�pria boca --, o presidente da Rep�blica constrange-nos a escolher entre uma destas alternativas: ou ele quer nos desorientar, ou est� ele pr�prio desorientado, ou estas duas hip�teses se mesclam indissoluvelmente na desorienta��o geral do pa�s.

O cidad�o comum que, de bon� do MST na cabe�a, fizesse apelos � paz no campo, seria imediatamente acusado de louco ou de piadista infame. Mas o presidente faz exatamente isso e o p�blico, n�o sabendo se deve rir ou chorar, indignar-se ou temer, prefere fingir que n�o viu nada. Finge uma vez, duas, tr�s: na quarta, seu c�rebro est� programado para n�o ver a quinta. Nem a sexta. Nem a mil�sima. Est� programado para n�o ver mais nada nunca mais e para aceitar com docilidade bovina tudo o que lhe entre pelos ouvidos, se vier de fonte oficial. Leiam Pavlov. � exatamente assim, literalmente assim que funciona a estimula��o contradit�ria. Seus efeitos j� s�o percept�veis em todo o territ�rio nacional, onde s�o cada vez em menor n�mero os olhos abertos para enxergar a enormidade grotesca das situa��es que se sucedem neste Brasil de 2003, Ano I da Era Lula.

Se eu quisesse endoidar um pa�s, esse seria o homem que eu escolheria para presidi-lo. Para ser respeitado, venerado, obedecido sem discuss�es, ele n�o precisaria ser um estadista inspirado, ter planos geniais, tomar decis�es corajosas. Ali�s n�o precisaria nem governar. Bastaria que falasse. Que falasse e continuasse falando exatamente do jeito que fala. Em breve tempo, n�o haveria mais c�rebro humano com for�as para contradiz�-lo. Sem modificar uma s� lei, sem desfigurar as institui��es, sem ferir no mais m�nimo que fosse a ordem democr�tica, ele teria se tornado rapidamente um monarca absoluto. Absoluto por absoluta falta, nos seus virtuais opositores, de condi��es neurol�gicas para dizer-lhe "N�o".