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PR�LOGO DE O IMBECIL COLETIVO

 

PR�LOGO DO PR�LOGO

Quando comecei a redigir estas p�ginas, n�o esperava dar-lhes nem mesmo aquela unidade externa e corp�rea, que duas capas e uma lombada conferem ao objeto denominado, neste caso mui impropriamente, "livro", e que a rigor se chamaria antes "volume" ou "bloco". N�o obedeciam a um plano de conjunto nem tinham sido concebidas no intuito de casar-se umas �s outras. Nelas se haviam anotado, ao acaso, minhas impress�es ante acontecimentos culturais do dia, � medida que os acontecimentos aconteciam, sem que nem mesmo neles minha vis�o atinasse com a unidade de qualquer inten��o demi�rgica, por mais secreta e sutil que fosse.

� medida que se acumulavam, por�m, notei que refletiam a converg�ncia impremeditada de meus focos habituais de aten��o para um preciso ponto. Levado por algum dem�nio oculto, meu c�rebro se tornara cada vez mais atento e sens�vel �s tolices irritantes que em doses cada vez maiores eu encontrava nos jornais, ditas por homens de letras nesta parte obscura do mundo, e das quais o anjo bom, movido pelos cuidados que lhe inspirava o alarmante incha�o do meu saco escrotal, me aconselhava em v�o guardar a m�xima dist�ncia e devot�-las a um merecido esquecimento. Por efeito seja do ac�mulo crescente, seja da minha aten��o obsessiva, o besteirol letrado come�ou a tomar a meus olhos quase a forma de um g�nero liter�rio independente, bem diferenciado e caracteristicamente nacional. Sim, do mesmo modo que a Alemanha havia encontrado a sua m�xima voca��o liter�ria na prosa filos�fica, a Inglaterra na poesia l�rica, a It�lia no verso �pico, a Espanha na narrativa picaresca, a R�ssia no romance, a Fran�a no jornalismo de id�ias, o Brasil encontrara a express�o perfeita da sua personalidade intelectual no jornalismo da falta de id�ias. E, uma vez afeito meu esp�rito ao consumo desse g�nero liter�rio tal como Dom Quixote se habituara ao dos romances de cavalaria, nada mais podia deter-me na busca de novas e cada vez mais deprimentes viv�ncias culturais.

Todas as manh�s, quando eu, entre vol�pias de masoca, me atirava �quelas letras viciosas, o pobre anjo, em v�o, tentava dissuadir-me, dirigir meu olhar a coisas mais higi�nicas, que iam desde a B�blia at� a revista Amiga, passando pelos cl�ssicos da literatura e pelas obras dos grandes fil�sofos, bem como pelas cota��es da Bolsa, pelas aventuras dos Cavaleiros do Zod�aco e pelos an�ncios de geladeiras a prazo. E eu, ap�s uma breve vista d’olhos nesse material, voltava com redobrada sanha �s obscenidades culturais em que me deleitava suinamente. S� faltou ele me oferecer literatura porn�, o que seria apela��o indigna do seu alto of�cio, mas creio que, se n�o o fez, foi menos por raz�es de moralidade do que por atinar de antem�o com a inocuidade desse expediente, tendo em vista a diversa dire��o tomada, de maneira aparentemente irrevers�vel, pelo meu furioso animus legendi. Sim, eu lia tudo, mas tudo o que era cultural, no sentido especial que esta palavra assumiu entre n�s desde o advento de Antonio Gramsci e Michael Jackson: o Caderno Id�ias do JB, as p�ginas liter�rias de O Globo, o Caderno de S�bado do Jornal da Tarde, o Suplemento Cultura de O Estado de S. Paulo, as revistas semanais Veja e Isto �, o Suplemento do Recife, as p�ginas de letras de A Tarde da Bahia e do Di�rio do Paran� (tudo, enfim. Tudo e o Mais!

O pretexto edificante que me movia, segundo eu imaginava no meu sonso auto-engano, era de �ndole patri�tica. Sim, replicava eu ao anjo, leio estas coisas em busca de um vest�gio de intelig�ncia, de um aceno de esperan�a, de um sinal ao menos por que possa defender o meu pa�s ante o trono do Alt�ssimo, mostrando-Lhe que n�o foi em v�o que nos deu neur�nios. O guardi�o de minh’alma perdia a paci�ncia:

— Ma che brutta bestia! (Desculpem o idioma: Na inf�ncia fui educado por padres italianos, e fiquei com a impress�o de que os anjos falam italiano. Doravante traduzo.) Ficas a� te fazendo de advogado do indefens�vel, e danas tua pr�pria alma com alimentos venenosos? Vai trabalhar, vagabundo!

N�o sei bem dizer quando se deu a virada interior, em que o intuito patri�tico se converteu ou perverteu de vez em masoquismo assumido. Foi a� que comecei a colecionar e ordenar estas notas. Ent�o disse-me o anjo:

Se queres mesmo, ent�o vai, sela teu destino: torna-te colecionador de asneiras. Mas, por Deus!, que n�o seja em pura perda. D� a essas tuas dores auto-infligidas uma utilidade e um sentido. Faze um livro, n�o para mostrar a Deus, que j� sabe de antem�o tudo o que te faz enxergar, mas para aqueles mesmos que n�o se enxergam e por n�o se enxergarem se mostram, quando deviam ocultar-se. Faze o trabalho do esp�rito: mostra-os a si mesmos, para que os humilhe o que os lisonjeou um dia, e, tombando de quanto mais alto subiram, conhe�am que humanos s�o. Junta teus pap�is, comp�e massuda escritura, se rude e tosca n�o vem ao caso, mas que n�o minta. E, para que n�o caias onde ca�ram aqueles de quem falas, toma tento: n�o te glories de ser a consci�ncia de ningu�m, pois o bem que acaso fizeres n�o ser� obra tua, e sim efeito da alquimia divina, que pode transmutar em bem at� o v�cio de ler o que n�o presta.

Maio de 1996.

 

PR�LOGO

Reuno aqui umas notas que fui tomando � margem do notici�rio cultural brasileiro entre 1992 e 1996. Referem-se todas a um tema �nico: a aliena��o da nossa elite intelectual, arrebatada por modas e paix�es que a impedem de enxergar as coisas mais �bvias. S�o observa��es esparsas, n�o pretendem tra�ar um diagn�stico de conjunto, mas indicam fortemente no sentido de uma suspeita: a suspeita de que algo no c�rebro nacional n�o vai bem1.

Todas tomam como ponto de partida algum acontecimento cultural local — um espet�culo, a edi��o de um livro, as palavras de algum figur�o ditas em entrevista — e procuram desentranhar as concep��es de ordem geral que encerram, julgando-as em seguida do ponto de vista da coer�ncia intr�nseca, do confronta��o com os fatos e das exig�ncias de uma cultura superior. Compensando, por�m, a homogeneidade dos temas e a unidade do crit�rio que os interpreta e julga, � m�ltiplo o enfoque e variado o estilo, motivo pelo qual se encontrar�o aqui desde breves ensaios filos�ficos ("Rorty e os animais" e "Nota sobre Charles S. Peirce") e de cr�tica cultural ("O imbecil coletivo" e "Christopher Lasch") at� esbo�os humor�sticos ("Id�ias vegetais" e Ap�ndices) e meras notas jornal�sticas, de modo que o leitor, girando de posi��o, n�o sinta o desconforto do assunto.

Este livro completa a trilogia que, iniciada com A Nova Era e a Revolu��o Cultural: Fritjof Capra & Antonio Gramsci e prosseguida com O Jardim das Afli��es. De Epicuro � Ressurrei��o de C�sar: Ensaio sobre o Materialismo e a Religi�o Civil, consagrei ao estudo da patologia intelectual brasileira no novo panorama do mundo. A fun��o dele na s�rie � mostrar, por meio de exemplos, a extens�o e a gravidade de um fen�meno de que o primeiro deu o alarma e cuja localiza��o na Hist�ria das Id�ias no Ocidente foi estudada no segundo2.

A sele��o das amostras � fortuita. Encontrei-as na imprensa. Certo ou errado, achei que podiam compor um exempl�rio significativo do estado de esp�rito dos letrados brasileiros na presente fase da nossa Hist�ria. "Letrado", na maioria dos casos, � apenas um modo de falar: designa as pessoas que teriam a obriga��o de s�-lo, em raz�o de cargo, of�cio, fama ou pretens�o.

O leitor talvez se espante de que alguns dos fatos aqui abordados n�o tenham por cen�rio o Brasil e sim os Estados Unidos3. Mas � que n�o falo da cultura norte-americana tal como a v�em os americanos do Norte, mas tal como ela aparece aqui, na nossa imprensa liter�ria. O material � de l�, mas o recorte seletivo � nosso: revela nossos interesses e prioridades. Em segundo lugar, e como se v� por esse recorte mesmo, a confus�o local consiste, quanto a alguns aspectos essenciais, num reflexo da crise da intelig�ncia norte-americana. Cronicamente incapaz de qualquer pensamento independente, a intelectualidade brasileira compensa sua m�ngua de for�a criadora com um excesso de sensibilidade para as oscila��es do mercado de id�ias no mundo: ningu�m, como os nossos letrados, tem um senso t�o agudo da "atualidade" e uma pressa t�o descarada de renegar da noite para o dia suas devo��es da v�spera, � menor suspeita de estarem "superadas". Vol�veis e inseguros, esfalfam-se por acertar o passo com as badaladas do rel�gio da moda, esse eco da Hist�ria que tomam pela Hist�ria mesma.

O desejo de seguran�a � um impulso normal do ser humano. Foi ele que impeliu os primeiros fil�sofos a buscarem uma verdade para al�m das flutua��es da opini�o. Mas esse desejo toma, entre os intelectuais brasileiros, um sentido caricatural e perverso. Em vez de buscar seguran�a numa intui��o direta e pessoal, imaginam poder encontr�-la na ades�o coletiva e epid�mica �s tend�ncias de prest�gio mais recente no que chamam "os grandes centros produtores de cultura" — express�o que j� revela toda uma concep��o coisista e mercadol�gica do que seja cultura. Temerosos demais para tentarem atinar por si com o certo e o errado, encontram al�vio e prote��o no sentimento de estar em dia com a opini�o mundial, ou com o que tal lhes parece4. Isto poupa-os de um esfor�o angustiante, reduzindo a atividade da intelig�ncia a uma opera��o de aritm�tica elementar, dedicada a buscar, em vez da ordem das raz�es, a mera soma das opini�es. Foi assim que, de c�pia em carbono da moda francesa, evolu�mos para nos tornar uma reprodu��o em fax da mentalidade norte-americana. Quando, nas �ltimas tr�s d�cadas, a crise do comunismo foi minando o prest�gio das grandes divas intelectuais do marxismo europeu, como Jean-Paul Sartre, Althusser, Luk�cs, a b�ssola intelectual brasileira girou de Paris para Nova York5, onde despontavam duas poderosas correntes de modas culturais: a Nova Esquerda e a Nova Era, New Left e New Age. Desde a d�cada de 60 o Brasil foi-se tornando cada vez mais dependente dos EUA em mat�ria de id�ias. E a� somaram-se v�rias circunst�ncias nefastas, para produzir o quadro presente da nossa mis�ria cultural.
        Primeira: A transfer�ncia da nossa matriz cerebral para Nova York deu-se justamente no momento em que os EUA entravam num decl�nio intelectual alarmante. Isto j� mostra nossa radical desorienta��o, nossa dificuldade de selecionar as influ�ncias segundo uma escala de prioridades sensatas, nossa propens�o a guiar-nos pelos sinais enganosos do brilho moment�neo. No romantismo preferimos Victor Hugo a H�lderlin. Em 22, quando havia no mundo um Rilke, um Yeats, seguimos a estrela cadente de Marinetti. Nos anos 50, ignoramos Husserl para seguir Jean-Paul Sartre, seu reflexo esmaecido. Agora deslumbramo-nos com a fosforesc�ncia de um Richard Rorty, de um Frederic Jameson, sem nos darmos conta de que � um desperd�cio importar novas maquiagens para filosofias defuntas, j� que a produ��o local de cosm�ticos funer�rios � auto-suficiente6.
        Segunda: O descr�dito mundial do marxismo coincidiu, no tempo, com a ascens�o das esquerdas ao primeiro plano da pol�tica nacional; e justamente na hora de sua maior gl�ria, elas se encontram mais desorientadas do que nunca, sem outros modelos a copiar sen�o os res�duos da decomposi��o intelectual norte-americana. E como a intelectualidade esquerdista ocupou todos os postos estrat�gicos da ind�stria de prest�gios — dominando as universidades, as comunica��es, o mercado de livros —, ela contaminou com a sua indig�ncia a totalidade da vida cultural brasileira7.
        Terceira: Nosso decl�nio intelectual foi acompanhado de um not�vel progresso dos meios materiais de difus�o da cultura: amplia��o e moderniza��o da ind�stria livreira, abertura de espa�os para o notici�rio cultural na TV e nas r�dios, aumento prodigioso do n�mero de vagas universit�rias, multiplica��o das verbas oficiais para a produ��o cultural, etc. Assim, quanto mais baixa a qualidade das id�ias, mais largos os canais por onde se despejam na cabe�a do povo — a latrina mental dos intelectuais. Pior ainda: premiando de supet�o o intelectual jovem, despreparado e sem lastro interior, o sucesso atua como o sinal encorajador de que um imbecil precisa para tornar-se um imbecil arrogante.

Mas aconteceu — quarta circunst�ncia —, que a arrog�ncia palavrosa da intelectualidade encontrou, no ambiente de indigna��o popular contra a mis�ria e a corrup��o, o mais potente dos est�mulos que as almas insinceras necessitam para livrar-se do �ltimo vest�gio de compostura: um pretexto moralizante. Quando a leviandade, a tolice, a arrog�ncia pretensiosa s�o convidadas a subir ao palanque para discursar em nome da "�tica", n�o h� mais limites para os progressos da inconsci�ncia: a moralidade � o �ltimo ref�gio dos imbecis8.

O quadro fecha-se no instante em que alguns espertalh�es da gera��o mais velha, vendo ascenderem ao primeiro plano da vida p�blica esses batalh�es de jovens desprovidos de ju�zo pr�prio e necessitados, por isto, de plantar no solo do apoio coletivo as mudas raqu�ticas de seus pensamentos, perceberam — quinta circunst�ncia — que podiam canalizar o potencial desses meninos em proveito de uma estrat�gia pol�tica determinada, bastando carapint�-los um pouco. � de massas de jovens pseudoletrados que se comp�e, precisamente, o "intelectual coletivo" do gramscismo: o aparelho partid�rio de agita��o e propaganda, onde a distribui��o de frases feitas, de preconceitos e de cacoetes mentais faz as vezes de vida intelectual. Da� o t�tulo deste livro.

Mas esse t�tulo � mais do que uma alus�o sat�rica. Ele ilustra com um m�nimo de imprecis�o uma das propriedades essenciais daquilo que se convencionou chamar a intelligentzia. Esta palavra russa, conv�m lembrar, n�o abrange em seu significado todas as pessoas empenhadas em tarefas cient�ficas, filos�ficas ou art�sticas, mas somente aquelas que falam com freq��ncia umas com as outras e se persuadem mutuamente de estar colaborando para algo que juram ser o progresso social e pol�tico da humanidade. Pensadores eminentes como Kurt G�del ou Edmund Husserl, poetas de primeira grandeza como Blake e Saint-John Perse, homens espirituais de elevada estatura como R�mana Maharshi ou Ren� Gu�non n�o fazem parte da intelligentzia, seja porque est�o pouco se lixando para o progresso social e pol�tico da humanidade, seja porque, ocupando-se preferentemente de assuntos intemporais, ficam � margem daquilo que seus contempor�neos entendem como "os grandes debates do nosso tempo" — a logomaquia universal que, se n�o produziu desde a Revolu��o Francesa nenhum resultado intelectualmente valioso, ao menos elevou de certo modo a um plano superior de exist�ncia uns duzentos milh�es de seres humanos, al�ando-os deste baixo mundo para o assento et�reo, j� que esse � mais ou menos o n�mero de v�timas das guerras ideol�gicas dos �ltimos dois s�culos. Em nada tendo colaborado para este resultado, os seis personagens referidos n�o s�o portanto intelectuais no sentido em que o s�o Voltaire, Plekhanov, Sartre e D. Marilena Chau�.

Uma vez compreendido o que � a intelligentzia9, a express�o que nomeia este livro adquire plena clareza como designa��o de uma das atividades principais dessa categoria de seres. O imbecil coletivo n�o �, de fato, a mera soma de um certo n�mero de imbecis individuais. �, ao contr�rio, uma coletividade de pessoas de intelig�ncia normal ou mesmo superior que se re�nem movidas pelo desejo comum de imbecilizar-se umas �s outras. Se � desejo consciente ou inconsciente n�o vem ao caso: o que importa � que o objetivo geralmente � alcan�ado. Como? O processo tem tr�s fases. Primeiro, cada membro da coletividade compromete-se a nada perceber que n�o esteja tamb�m sendo percebido simultaneamente por todos os outros. Segundo, todos juram crer que o recorte minimizador assim obtido � o �nico verdadeiro mundo. Terceiro, todos professam que o m�nimo divisor comum mental que opera esse recorte � infinitamente mais inteligente do que qualquer indiv�duo humano de dentro ou de fora do grupo, j� que, segundo uma autorizada porta-voz dessa entidade coletiva, "a psican�lise, com o conceito de inconsciente, e o marxismo, com o de ideologia, estabeleceram limites intranspon�veis para a cren�a no poderio total da consci�ncia aut�noma, enfatizando seus limites" (sic)10. Assim, se um dos membros da coletividade � mordido por um cachorro, deve imediatamente telefonar para os demais e perguntar-lhes se foi de fato mordido por um cachorro. Se lhe responderem que se trata de mera impress�o subjetiva (o que se dar� na maioria dos casos, j� que � altamente improv�vel que os cachorros entrem num acordo de s� morder as pessoas na presen�a de uma parcela significativa da comunidade letrada), ele deve incontinenti renunciar a considerar esse epis�dio um fato objetivo, podendo por�m continuar a falar dele em p�blico, se o quiser, a t�tulo de express�o pessoal criativa ou de cren�a religiosa. Para o imbecil coletivo, tudo o que n�o possa ser confirmado pelo testemunho un�nime da intelligentzia simplesmente n�o existe. Compreende-se assim por que o mundo descrito pelos intelectuais � t�o diferente daquele onde vivem as demais pessoas, sobretudo aquelas que, imersas na ilus�o do poderio total da consci�ncia aut�noma, acreditam no que v�em em vez de acreditar no que l�em nos livros dos professores da USP.

O presente livro, portanto, trata daquilo que n�o existe: daquilo que est� fora do mundo tal como o concebe a intelligentzia, mas que est� lim�trofe � sua circunfer�ncia e pode ser enxergado com perfeita nitidez por quem quer que consinta em deixar de ser um intelectual por uns minutos e d� uma espiada fora, fazendo uso, mesmo discreto, dos poderes limitad�ssimos da sua consci�ncia individual.

Muitos ver�o neste livro um requisit�rio, uma diatribe furibunda e pe�onhenta contra os intelectuais brasileiros. Pessoas nas quais os horm�nios da emo��o s�o mais ativos do que as luzes da intelig�ncia11 s�o incapazes de compreender que �s vezes temos de dizer coisas horr�veis n�o porque elas brotem do nosso est�mago, mas porque entram pelos nossos olhos; que n�o dizemos o que queremos, mas o que vemos — e que o fazemos sem nenhum prazer, muito menos o prazer hip�crita de um moralista de palanque, que se imagina bom quando consegue provar que algu�m � ruim. Acusadoras compulsivas, pertinazes atribuidoras de suas pr�prias inten��es a outrem, s�o ineptas para conceber que aquele que diz palavras amargas pode n�o ser movido pelo intuito de denunciar, de acusar, mas de descrever e advertir; e que se o discurso vem num tom de franqueza brutal, � porque o estado de coisas descrito ultrapassou os limites do toler�vel e a advert�ncia j� vem tarde.

N�o tenho a menor d�vida de que este livro ter�, numa boa fatia dos ambientes letrados, a recep��o-padr�o dada a outros tantos livros brasileiros, alguns at� bem melhores, que tinham por objetivo fazer pensar: o completo sil�ncio quanto ao conte�do, uma flora��o majestosa de fofocas e cal�nias quanto � pessoa do autor12. � caracter�stico da nossa baixeza intelectual que, quanto menos algu�m compreende o simples enunciado de uma id�ia, mais se julga capacitado a diagnosticar os motivos psicol�gicos profundos e at� mesmo inconscientes que teriam levado o autor a produzi-la. Isso tem a indiscut�vel vantagem de desviar a discuss�o dos terrenos �ridos da filosofia, da ci�ncia, etc., para as f�rteis plan�cies da psican�lise-de-botequim, onde todo brasileiro se sente um expert tanto quanto em t�cnica de futebol, economia pol�tica e mec�nica de autom�veis. Os motivos diagnosticados s�o invariavelmente m�rbidos ou sinistros — �dio � humanidade, complexo de �dipo, homossexualismo enrustido, machismo porco-chauvinista, egolatria demencial, inveja recalcada, ressentimento neur�tico, desejo furioso de autopromo��o etc. etc. —, de modo a encobrir a pessoa do autor com uma m�scara suficientemente antip�tica para dissuadir qualquer leitor de fazer um esfor�o para compreend�-lo. Homens verdadeiramente grandes — um M�rio Ferreira dos Santos, um Gilberto Freyre, um Otto Maria Carpeaux, um Oliveira Vianna — foram abundantemente submetidos a esse tipo de maquiagem caricaturante, de modo que, vendo-os reduzidos a estere�tipos de f�cil apreens�o, cada leitor potencial cr� j� conhec�-los o bastante para poder dispensar-se de examinar de perto o que escreveram. Por que haveria eu de escapar a semelhante destino? A intriga e a cal�nia — �s vezes nada espont�neas, mas dirigidas com precis�o e esp�rito de sistema desde os centros interessados — t�m sido no Brasil a forma mais usual de cr�tica liter�ria13. Parece que ningu�m se d� conta de quanto o pa�s todo — caluniadores inclusos — perde com isso. Pois a rede de temores v�os, desconfian�as, preconceitos e preven��es supersticiosas que esse h�bito lan�a sobre a nossa vida cultural aprisiona a intelig�ncia brasileira num complexo neur�tico e incapacitante, frustra o interc�mbio das inspira��es, estanca o fluxo das id�ias, sufoca as for�as criadoras e nos condena � perp�tua anemia espiritual14.

Mas h� sempre muitos leitores bons, desejosos de compreender mesmo aquilo que � primeira vista os desagrade. Esses n�o me levar�o a mal a priori, imaginando que atribuir inten��es seja o mesmo que compreender; e notar�o desde logo um fato que contradiz, na base, qualquer diagn�stico de hidrofobia liter�ria que algum desafeto mais ousado pretenda me passar com a autoridade cient�fica que lhe � conferida pelo d�cimo copo de cacha�a: o fato de que, no pa�s do corporativismo, onde cada qual s� discursa pro domo sua, este que lhes fala � um raro e n�o despiciendo exemplo de brasileiro capaz de fazer graves censuras ao seu pr�prio gr�mio, punindo, como recomenda a sabedoria milenar do I Ching, sua cidade natal antes de fustigar a alheia. Pois, tendo vivido trinta anos e picos de meu trabalho de jornalista, escritor, professor e conferencista, que raio de outra coisa sou sen�o um membro do cl� dos letrados? O discurso anticorporativo est� na moda, tem buena prensa, e um p�blico ing�nuo n�o se d� conta de que falar contra o corporativismo alheio � com freq��ncia apenas um jeito elegante de fortalecer o pr�prio. Invertendo essa f�rmula maliciosa, critico aqui os meus. E, pela tiragem modesta deste livro que n�o ser� decerto lido pelas multid�es incultas, ningu�m dir� sem grave injusti�a que lavei nossa roupa suja fora de casa. � claro que estabele�o uma distin��o entre os homens letrados em geral e, como foi dito acima, a intelligentzia em especial, atribuindo exclusivamente a esta �ltima a jurisdi��o do imbecil coletivo. Mas a intelligentzia est� para a classe culta como a parte para o todo, como um ramo da fam�lia est� para a fam�lia, e sua pretens�o mesma de falar em nome da fam�lia inteira justifica que eu me dirija a ela como a gente do mesmo sangue — de igual para igual, no tom irritado de quem n�o fala de cima, julgando e condenando com neutra autoridade, mas se sente contaminado e envergonhado pelas culpas dos seus.

Quanto ao subt�tulo, insere francamente este trabalho no g�nero liter�rio inaugurado por Osman Lins: estudos de problemas inculturais. Um g�nero a que o ambiente nacional, a julgar pelos sinais dos tempos, n�o sonegar� t�o cedo nem temas nem motivos15. Sonegar� apenas oportunidades de publica��o. O lugar certo para trabalhos deste g�nero �, manifestamente, a imprensa di�ria ou semanal, j� que eles acompanham jornalisticamente o desenrolar dos fatos e se distinguem do puro notici�rio apenas ao procurar, na retaguarda mais ampla da Hist�ria cultural, a liga��o entre o curso dos dias e o rolar dos s�culos, tal como aparece aos olhos de uma consci�ncia aut�noma. Mas n�o creio que exista, na imprensa brasileira, uma atmosfera prop�cia � discuss�o dos temas aqui presentes, pela simples raz�o de que o jornalismo � o templo mesmo da intelligentzia e de que as pautas de reda��o constituem o traslado fiel do recorte minimizador acima referido, isto caso n�o constituam o seu molde. E se n�o h� nas p�ginas de jornais um lugar para estes temas, muito menos h� para a linguagem muito pessoal e direta, �s vezes abertamente desaforada, em que me sinto mais � vontade para falar deles — n�o porque seja um sujeito explosivo ou ranheta por natureza, mas porque h� d�cadas n�o escuto neste pa�s sen�o a voz do imbecil coletivo e porque, tenham ou n�o sido confirmados pela psican�lise e pelo marxismo, existem limites intranspon�veis para a extensibilidade do saco humano.

At� umas d�cadas atr�s, o jornalismo brasileiro ainda n�o adquirira consci�ncia do seu poder supremo e consentia em ecoar o pensamento vindo de fora, muitas vezes pessoal e direto no conte�do e no tom. Depois, a padroniza��o da t�cnica jornal�stica trouxe o imp�rio do pensamento mediano e da linguagem morna, escorado em toda uma tecnologia da precau��o, em toda uma engenharia da dubiedade16. Bilinguis maledictus. Ao mesmo tempo, o jornalismo — junto com seu irm�o siam�s, o marketing — erguia-se de sua posi��o de servidor da cultura para se tornar seu modelo e senhor, rebaixando a produ��o cultural a um eco passivo do notici�rio do dia.

Um outro obst�culo � publica��o destes textos em jornal � o seu tamanho. As modifica��es "t�cnicas" introduzidas no nosso jornalismo a partir da d�cada de 60 timbram em cortar tudo pelo molde da cr�nica, do suelto ou do "pirolito", e um articulista de id�ias � hoje um sujeito que dispara meia d�zia de frases de efeito sobre um leitor desatento e vai para casa todo envaidecido de sua habilidade de resumir a B�blia em um par�grafo, quando Deus precisou de nada menos que dez. Afirmar � f�cil, provar � dif�cil. O enunciado de um teorema espreme-se em uma linha; a demonstra��o pode requerer v�rias p�ginas. A norma jornal�stica vigente implica nada menos que uma proibi��o de provar, uma obriga��o estrita de ater-se � afirma��o perempt�ria, se poss�vel proferida naquele tom de autoridade que, dissuadindo os poss�veis objetores, abrevia razoavelmente a conversa. A pregui�a de ler vem em aux�lio da norma, condenando como "prolixo" tudo o que v� al�m da asser��o pura e simples. Isto acaba por fazer do jornalismo aquilo que dizia Conrad: uma coisa escrita por idiotas para ser lida por imbecis.

Por isto estes artigos, escritos no estilo de um tipo de publica��o que n�o existe mais, acabaram virando livro — um jornalismo sem jornal. Dos trabalhos aqui presentes, s� uns poucos sa�ram na imprensa: um no mais modesto — ainda que n�o o menos valoroso — jornal carioca, a Tribuna da Imprensa, outro no Jornal do Brasil, outros dois num rec�m-fundado caderno liter�rio de O Globo, e um numa revista para jornalistas, um ambiente de fam�lia onde estes profissionais se permitem o luxo da franqueza, que reprimem no exerc�cio p�blico de seu of�cio com uma austeridade de santos ascetas.

Bons amigos recomendam-me que n�o fale assim, que modere o tom, que selecione os alvos e ataque um por vez de modo a n�o voltar todos contra mim de um s� golpe. In�teis precau��es. A maledic�ncia n�o � racional na escolha de suas v�timas. Posso cair em suas garras por uma frase infeliz, como posso escapar delas malgrado uma farta distribui��o de verdades amargas. A fortuna � mais s�bia do que a ast�cia — e ast�cia, ademais, n�o � o meu forte, not�ria que � entre meus conhecidos a minha demora em perceber quando algu�m me faz de trouxa17.

Por fim, digo que s� teria sentido contornar as suscetibilidades de grupos e fac��es caso meu livro se dirigisse a grupos e fac��es. Ora, ele dirige-se exclusivamente ao leitor individual, na solid�o da sua consci�ncia, naquele seu fundo insuborn�vel de que falava Ortega y Gasset, que todo homem tem e onde ele � capaz de admitir, entre quatro paredes, verdades que renega em p�blico. Dirijo-me ao que h� de melhor no �ntimo do meu leitor, n�o �quela sua casca temerosa e servil que diz am�m � opini�o grupal por medo da solid�o. Fazer o contr�rio seria um desrespeito. Portanto, iracundo leitor, n�o me censure em p�blico antes de certificar-se de que n�o me dar� raz�o na intimidade, quando, no cora��o da noite, as palavras que lhe brotarem de dentro n�o encontrarem outro interlocutor sen�o o sil�ncio imenso.

Maio de 1996

 

NOTAS

  1. Por que tomei como exemplo esse per�odo? Por nada de mais: s� porque o livro tinha de come�ar e terminar. Se eu n�o lhe impusesse arbitrariamente um fim, a colheita de amostras poderia continuar indefinidamente e tornar-se um objetivo em si, porque, se o imbecil coletivo n�o � eterno, parece ao menos ser infinito em sua capacidade produtiva. E este livro, para acompanh�-lo (o que n�o estava nos meus planos), teria de ser uma publica��o peri�dica, uma se��o de jornal como o Febeap� de Stanislaw Ponte Preta. Seria o Febeap� dos intelectuais...Voltar
  2. N�o obstante formem uma trilogia, cada um dos tr�s livros pode ser lido independentemente, sem preju�zo da compreens�o.Voltar
  3. Como nenhuma das id�ias que comp�em a constela��o mental do imbecil coletivo � de origem nacional, n�o escapar� ao leitor atento que este livro, tomando como seu foco imediato de aten��o o caso brasileiro, constitui uma cr�tica da cultura contempor�nea em escala mundial, ou pelo menos euro-americana. O Brasil torna-se ilustrativo de certas tend�ncias mais perigosas embutidas nessa cultura, justamente por sua posi��o de receptor passivo e indefeso de influ�ncias que, nos seus pa�ses de origem, s�o �s vezes desafiadas, combatidas e vencidas pela oposi��o consciente de intelectuais de valor. O Imbecil Coletivo pode ainda ser compreendido como um pref�cio, informal e jornal�stico, ao meu estudo maior O Olho do Sol. Ensaio sobre Intelig�ncia e Consci�ncia — que na sua primeira parte abordar� de maneira mais sistem�tica, e com um panorama hist�rico mais amplo e uniforme, a luta da fal�cia coletivista para subjugar e perverter a consci�ncia humana, e na segunda enfocar� o mesmo assunto pelo prisma puramente te�rico da gnoseologia. E, ao leitor que seja mais atento ainda, ficar� patente por tr�s da forma de colet�nea a unidade do presente livro — a unidade de um enfoque �nico lan�ado sobre amostras variadas e ocasionais.Voltar
  4. As rea��es c�cl�cas de nacionalismo epid�rmico nada podem contra isso. Fundam-se na id�ia de que a na��o deve ter um pensamento independente antes que os pensadores nacionais o tenham. Chutam para um coletivo abstrato a responsabilidade que incumbe a indiv�duos concretos. Substituem um coletivismo servil por um coletivismo xen�fobo, que nos isola do mundo por uns tempos, at� cairmos de novo no temor de ficar para tr�s. � um c�rculo vicioso.Voltar
  5. "A decis�o do Itamaraty de retirar a l�ngua francesa da prova de sele��o para diplomatas trouxe como ponta de lan�a uma pol�mica e, a reboque, uma constata��o: a influ�ncia da cultura francesa no Brasil vive do passado... A atriz e cineasta Norma Bengell (...) disgnostica: ‘As novas gera��es est�o mais ligadas ao cinema americano.’ (...) O escritor Marcos Santarrita lamenta: ‘Parece que secaram as id�ias na Fran�a. Os �ltimos pensamentos originais na Fran�a foram os de Sartre, Camus e Merleau-Ponty.’" (Berenice Seara e Elizabeth Orsini, "Outono de uma refer�ncia cultural", O Globo, 30 de mar�o de 1996.) Esses par�grafos mostram que 1�, o giro do eixo de influ�ncia se tornou consciente e assumido; 2�, os intelectuais brasileiros, de modo geral, s� acompanham, da produ��o de id�ias no Exterior, as partes mais vistosas; portanto, do empobrecimento da m�dia cultural parisiense, deduzem um esgotamento da produ��o cultural francesa, e rapidamente voltam os olhos na dire��o de um foco mais atraente. Mas o fato � que nas �ltimas d�cadas a Fran�a nos deu um Pierre Boudieu, um �ric Weil, um Andr� Marc, um Ren� Girard — pensadores muito mais profundos e consistentes do que Sartre ou Camus —, e infinitamente mais valiosos do que todos os c�rebros acad�micos dos EUA somados e multiplicados. S� que est�o fora do c�rculo de aten��o lowbrow. V., adiante, o cap�tulo "O cisco e a trave".Voltar
  6. E mesmo quando, movidos por um remanescente prurido nacionalista, escolhemos venerar de prefer�ncia, entre os autores norte-americanos, aqueles que s�o os cr�ticos mais severos da cultura de seu pa�s, acabamos por consolidar ainda mais nossa posi��o de consumidores passivos e sem crit�rio de sele��o; porque a produ��o de autocr�ticas � uma das mais potentes ind�strias de uma cultura afetada de radical falta de assunto, e h� d�cadas os norte-americanos n�o t�m nada a comunicar ao mundo sen�o os ecos de seus conflitos dom�sticos. A esta discuss�o local um audit�rio mundial sensato deveria responder normalmente com o mais soberbo desinteresse, mas, por efeito do marketing editorial, ela acaba parecendo universalmente importante, sobretudo aos olhos de povos incapazes de formular seus problemas em seus termos pr�prios, e necessitados portanto de moldar seu debate interno por uma pauta estrangeira. Assim, quanto mais a intelig�ncia norte-americana se fecha num provincianismo egoc�ntrico e perde o sentido da medida universal, mais tendemos, n�s outros de south of Rio Grande, a fazer dela o padr�o da medida universal: trocamos o senso da Hist�ria pelo senso da atualidade americana. De um s� golpe, alienamo-nos de n�s mesmos e do universo, deixando que o gigante enlouquecido nos arraste e nos aprisione em seu del�rio de auto-an�lise. Imitando uma cultura que se perdeu de si mesma, perdemo-nos ainda mais, e j� n�o somos capazes nem de julg�-la nem de julgar a n�s pr�prios. Triste exemplo disto � a admira��o exagerada que concedemos a certos cr�ticos atuais da cultura norte-americana sem repararmos que nada nos dizem que j� n�o tenha sido dito, e melhor, por algu�m das gera��es passadas.Voltar
  7. O mais curioso, a�, � que as pessoas deixam de ser marxistas mas n�o sabem ser outra coisa, porque tudo o que leram na vida foi com os olhos de Marx. O resultado � que esses ex-marxistas continuam raciocinando dentro de um quadro de refer�ncia demarcado pelo materialismo dial�tico, pela luta de classes e por todos os demais conceitos cl�ssicos de um marxismo que j� n�o ousa dizer seu nome...Voltar
  8. J� o velho Bernanos, um profeta, advertia que jamais se deve fazer — nem mostrar — o mal aos imbecis: primeiro, porque eles t�m mais facilidade do que as outras pessoas em sentir-se indignados; segundo, porque t�m a propens�o incoerc�vel de reunir-se em milhares, em milh�es, para refor�ar mutuamente sua c�lera; terceiro, porque, uma vez encolerizados por motivo justo, eles perdem todo o senso das propor��es na produ��o de injusti�as reparadoras: o destino do mundo teria sido diferente se desde o come�o do s�culo as imagens da guerra, da mis�ria, da fome e da exclus�o social n�o houvessem intoxicado de justa c�lera os c�rebros de milh�es de jovens imbecis, predispondo-os a encontrar consolo nas promessas de L�nin, St�lin, Mao Ts�-tung, Benito Mussolini e Adolf Hitler.Voltar
  9. Caso n�o esteja compreendido, pode-se consultar N. Berdiaev, Les Sources et le Sens du Communisme Russe (Paris, Le Seuil, 1948, Cap. I). Mas se o leitor n�o encontrar o livro de Berdiaev pode recorrer ao seu exemplar dom�stico da B�blia (I Cor.,: I:26), onde, segundo aprendi em C. S. Lewis, se encontra a mais precisa defini��o da referida classe: sofoi kata sarka, sofoi kata sarka, "s�bios segundo a carne".Voltar
  10. Marilena Chau�, "�tica e Universidade", em Ci�ncia Hoje (revista da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ci�ncia), vol. 18, n� 102, agosto de 1994. A frase � um tanto esquisita, mas, no conte�do, muito elucidativa. Ela nos informa que a psican�lise e o marxismo, apesar dos enganosos dizeres nas capas dos seus livros respectivos, foram descobertas coletivas, j� que as consci�ncias individuais dos srs. Freud e Marx, fechadas em seus limites intranspon�veis, jamais poderiam atinar com esse g�nero de coisas. A prova irrefut�vel � que todo mundo j� era psicanalista antes de Freud e marxista antes de Marx, entrando na hist�ria estes dois senhores apenas nos pap�is de maridos enganados — os �ltimos a saber.Voltar
  11. Um dos muitos cap�tulos faltantes neste livro trataria da festiva e equivocada recep��o dada nesta parte do mundo ao livro do neurologista portugu�s Ant�nio Dam�sio, O Erro de Descartes (S�o Paulo, Companhia das Letras, 1996) e ao de Daniel Goleman, Intelig�ncia Emocional (trad. Marcos Santarrita, Rio, Objetiva, 1996). Ambos esses livros enfatizam uma verdade �bvia, esquecida ou desprezada pelo establishment psicol�gico norte-americano: o processamento das emo��es � mais decisivo para um bom desempenho intelectual do que o QI. Acontece que ambos os autores, para divulgar essa id�ia, recorreram ao expediente publicit�rio de opor sua apologia da intelig�ncia emocional ao "racionalismo" de Descartes e Kant. Mera figura de linguagem, � claro, que n�o se funda numa vis�o historicamente fidedigna das doutrinas desses dois pensadores, mas na sua imagem popular, brutalmente simplificadora e caricatural (Descartes, racionalista em metaf�sica, era em �tica um voluntarista bastante "irracional"; e chamar Kant de racionalista � coisa de analfabeto). No Brasil, por�m, Dam�sio e Goleman foram levados ao p� da letra, com ingenuidade caipira (v. caderno Id�ias do Jornal do Brasil, 6 de abril de 1996), da� resultando uma grossa apologia da emo��o contra a raz�o, fundada na confus�o mais burra entre as emo��es e seu processamento intelectual, bem como na total indistin��o entre emo��o direta e emo��o est�tica, ou imaginativa. Tudo, � claro, para lisonjear o preconceito anti-intelectual de certas faixas de p�blico e aproveitar o sucesso do filme Raz�o e Sensibilidade como excipiente para venda de livros. Coisa, enfim, de uma baixeza inomin�vel, que reduz o jornalismo de id�ias ao n�vel de divulga��o cient�fica para adolescentes.Voltar
  12. Um de meus livros anteriores — Uma Filosofia Aristot�lica da Cultura — j� teve esse mesmo destino, embora n�o falasse mal de ningu�m e se ativesse a inofensivas especula��es em torno da l�gica de Arist�teles.Voltar
  13. V. adiante o cap�tulo "Carta a Oxfordgrado".Voltar
  14. � tamb�m previs�vel que alguns se dispensem de entrar em coment�rios psicol�gicos, n�o por serem especialmente discretos, mas por imaginarem, n�o sem alguma raz�o, que para sujar de vez uma reputa��o a rotulagem ideol�gica � muito mais eficaz do que a difama��o pessoal direta e possui ainda a vantagem de parecer coisa intelectualmente elevada. Uma boa parte do p�blico n�o tem, de fato, a menor condi��o de conceber, sob o nome de "an�lise cr�tica", nada mais inteligente do que o c�lculo dos coeficientes relativos de progressismo e reacionarismo, do qual se obt�m com precis�o matem�tica o crit�rio de admiss�o ou rejei��o de um autor no c�rculo das pessoas de bem. V., adiante, o cap�tulo "Fanatismo sem nome".Voltar
  15. V. Osman Lins, Do Ideal e da Gl�ria. Problemas Inculturais Brasileiros (2a. ed., S�o Paulo, Summus, 1977) e Evangelho na Taba. Outros Problemas Inculturais Brasileiros (S�o Paulo, Summus, 1978).Voltar
  16. Da� as rea��es de virginal esc�ndalo dos nossos letrados �s cr�ticas mordazes — e, no conte�do, nada mais que justas — feitas por Bruno Tolentino a uma tradu��o de Augusto de Campos. Comento isto mais adiante.Voltar
  17. Ademais, se O Imbecil Coletivo provocar irrita��o e desagrado, n�o ser� por muito tempo: n�o somente ele ser� esquecido em breve, como tamb�m passar�, junto com ele, o interesse do p�blico pelos mi�dos personagens de que trata. E, para completar, nem eu mesmo voltarei ao assunto, de vez que, se a Provid�ncia n�o dispuser em contr�rio, encerrarei com este livro minha carreira de polemista, para dedicar-me doravante a trabalhos te�ricos sobre temas que n�o despertar�o neste pa�s a menor como��o.Voltar

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