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Leituras recomendadas � 46

 

Antipsiquiatria

VICTOR LEONARDO DA SILVA CHAVES

Coronel �M�dico da R/Rm da Aer. CREMERJ 52-12223-0
Ex-psiquiatra do Quadro de Sa�de da Aeron�utica.
T�tulo de psiquiatra conferido pela Associa��o Brasileira de Psiquiatria e Associa��o M�dica Brasileira em 1970; pelo Conselho Federal de Medicina e Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro em 1986.
Ex-membro da Associa��o Brasileira de Psiquiatria [1970/1994] e Associa��o Psiqui�trica do Estado do Rio de Janeiro [1968/1994].
Licenciado em Filosofia pela UERJ.

 

1.     Introdu��o.� Em princ�pio do outono de 2001, a imprensa anarco-comunista anunciou que o Congresso aprovara em 27 de mar�o o projeto de lei do Deputado Paulo Delgado [PT de MG], que propunha a extin��o de manic�mios, tendo sido sancionado pelo executivo em 6 de abril. H� ind�cios de m�-f�, pois tal projeto fora aprovado em 1989, somente na C�mara Federal por voto de lideran�as e derrotado no Senado Federal, seguido pelos substitutivos dos Senadores Luc�dio Portela e Sebasti�o Rocha. Ambos modificaram substancialmente o projeto original. Esse �ltimo substitutivo � o que foi aprovado nas datas acima, tornando-se a Lei 10 216 de 06/04/01[D.O.U. 09/04/01]. Essa mistifica��o foi feita pela esquerda que domina os meios de comunica��o, pois esse projeto � uma express�o pol�tica de uma doutrina de inspira��o anarco-comunista, denominada de antipsiquiatria.

2.     Defini��o.O termo antipsiquiatria passou a ser usado na d�cada de sessenta para designar uma corrente doutrin�ria na �rea de sa�de mental que tinha por caracter�stica principal contestar a validade da Ci�ncia M�dica para resolver os problemas de psiquiatria. Seus conceitos propagaram-se para �reas afins, no bojo dos movimentos de protesto das conturbadas d�cadas de 60 e 70, que julgam n�o existir doen�as mentais e que a nosologia m�dica psiqui�trica n�o passa de um conjunto de r�tulos, apregoando o fechamento dos estabelecimentos m�dicos psiqui�tricos.� Roudinesco [1], em seu Dicion�rio de Psican�lise, fornece a seguinte defini��o: Embora o termo antipsiquiatria tenha sido inventado por David Cooper num contexto muito preciso, ele serviu para designar um movimento pol�tico radical de contesta��o do saber psiqui�trico [grifo nosso], desenvolvido entre 1955 e 1975 na maioria dos grandes pa�ses em que se haviam implantado a psiquiatria e a psican�lise [grifo nosso]: na Gr�-Bretanha, com Ronald Laing e David Cooper; na It�lia, com Franco Basaglia; e no Estados Unidos, com com as comunidades terap�uticas, os trabalhos de Thomas Szasz e a Escola de Palo alto de Gregory Bateson. (...) Como utopia, a explos�o da antipsiquiatria foi radical, e Cooper sublinhou isso ao discursar em Londres, na tribuna do congresso mundial de 1967, o qual almejava inscrever a antipsiquiatria no quadro de um movimento geral de liberta��o dos povos oprimidos [grifo nosso] (...) Cooper prestou uma vibrante homenagem aos participantes da comuna de 1871, que haviam atirado nos rel�gios para acabar com �o tempo dos outros, o dos opressores, e assim reinventar seu pr�prio tempo� [observe a orienta��o pol�tica anarquista]. Antipsiquiatria � uma ideologia perniciosa, de inspira��o anarquista. � formada pela conflu�ncia de v�rias correntes de pensamento que dominaram a sociedade ocidental a partir do final do S�culo XIX e parece que se adentrar�, infelizmente, pelo XXI.

3.     Antecedentes hist�ricos.

3.1. A passagem do S�culo XIX para o XX foi marcada por duas correntes filos�ficas: o niilismo de Nietzsche e a fenomenologia de Husserl. �O niilismo � uma doutrina iconoclasta que faz apologia do nada. A fenomenologia, inspirada em Kant, afirma a primazia do fen�meno em rela��o ao n�meno. Esse �ltimo seria inacess�vel ao sujeito, portanto, s� sendo percept�vel o primeiro. Com isso, Husserl quis mostrar a identifica��o entre sujeito e objeto em vez da intera��o entre os dois. Querendo ou n�o, sua doutrina acaba por privilegiar o sujeito em detrimento do objeto, dando margem ao excesso de subjetivismo que caracterizou o S�culo XX. Essas duas correntes vieram a inspirar o existencialismo fenomenol�gico de Heidegger, o existencialismo materialista de Sarte, a �filosofia da ambig�idade� de Merlau-Ponty, que sustenta que a experi�ncia humana possui um sentido eminentemente enigm�tico [2], todas as manifesta��es estruturalistas, inclusive o descontrutivismo de Derrid�, a Escola de Frankfurt e o C�rculo de Viena.

3.2. Esse per�odo caracterizou-se tamb�m pelo aparecimento das correntes chamadas de psicologia profunda [Freud, Adler, Jung e outros] que afirmam que a conduta humana � dirigida por uma inst�ncia mental irracional, que chamam de inconsciente din�mico.� Esse menoscabo da raz�o induziu a uma identifica��o de liberdade com irresponsabilidade. Muitas delas aceitam como parte da mente normal a bissexualidade, a homossexualidade [a crian�a seria um polimorfo perverso, pois encerraria em lat�ncia todas as pervers�es sexuais dos adultos] e o uso de doen�a mental (neuropsicoses de defesa) como um meio que a mente tem para se defender dos conflitos. Isso eliminou os limites entre sadio e patol�gico, e influenciou o Manisfeste du Surr�alisme, de 1924, quando Andr� Breton prop�e o n�o-conformismo e a tese do automatismo mental. No primeiro princ�pio, faz apologia da iconoclastia e, no segundo, defende o aetismo extremo, em que o autor deveria escrever tudo que lhe viesse � mente [patol�gica, evidentemente], sem a menor censura, mesmo que o conte�do viesse a escandalizar os bons costumes, tal como incesto, bestialidade ou qualquer outra pervers�o.

3.3. Na d�cada de trinta [1933], alguns soci�logos americanos cunharam a express�o �psiquiatria social� [3] com a pretens�o de transformar a Medicina em sociologia.� A revista �M�DICOS�, editada pela USP, apresentou em seu n�mero de dezembro de 1998 [ANO 1, N� 5, pg. 100] a opini�o da soci�loga Maria Helena Machado que atribui� � Medicina ( saber cient�fico com a finalidade de aliviar a dor e salvar vidas) uma �alian�a com o Estado (...) e com a elite dominante�.� Esse despaut�rio demonstra o descalabro que a �sociologiza��o� da Medicina atingiu.

3.4. Foi na d�cada de sessenta do S�culo XX, que explodiu o laxismo [laissez-faire extremo na esfera moral] fomentado por essas doutrinas de pensamento.� Come�ou com o movimento hippie, tendo por fundamento est�tico o extravagante, o aberrante, tudo que causasse esc�ndalo; criatividade passou a ser sin�nimo de extravag�ncia, aberra��o, esc�ndalo. Na esfera moral o mote foi �paz e amor�: com paz eles queriam dizer ociosidade; com amor, lux�ria, devassid�o dos costumes. Foi a era da libera��o do sexo e t�xico, quando tudo deveria ser permitido, a hierarquia passou a ser ris�vel, a ordem, opress�o e a obedi�ncia, submiss�o. A palavra de ordem foi contestar, contestar por contestar, sem o menor fundamento. A �nica coisa a proibir foi proibir. Esse foi o lema das badernas das ruas de Paris em maio de 1968, lideradas pelo fil�sofo Herbert Marcuse e apoiadas por v�rios intelectuais como Sartre, Simone de Beauvoir e outros an�rquico-socialistas [4].� Em agosto de 1969, ocorreu o festival em Woodstock, quando imperou a promiscuidade sexual, o abuso de t�xico, a falta de higiene, a extravag�ncia.

4.     Forma��o da ideologia antipsiqui�trica.

4.1. Fran�ois Dosse [5] afirma que em 1952 a UNESCO encomendou a Levy-Strauss [antrop�logo de orienta��o estruturalista] um estudo sobre �a quest�o racial perante a ci�ncia moderna�.� O autor publica o livro �Race e Histoire� que, querendo derrubar os preconceitos raciais, ent�o ainda t�o presentes suas conseq��ncias funestas [sete anos ap�s a Segunda Guerra Mundial], extrapolou para o extremo oposto, sustentando a aus�ncia de hierarquia entre as civiliza��es. Uma cultura que ainda exigia sacrif�cios humanos estaria no mesmo grau de igualdade como a cultura crist�.� Essa ideologia concorreu para incentivar a iconoclastia em curso e resultar na Nova Era [New Age] da d�cada de sessenta.

4.2. O fil�sofo franc�s Michel Foucault [1926/1984] deu uma grande contribui��o para a forma��o da ideologia antipsiqui�trica com seus livros iconoclastas: Hist�ria da Loucura na Idade Cl�ssica [1961], As Palavras e As Coisas [1966], Arqueologia do Saber [1969].� Esse indiv�duo � suspeito, pois em 1948, tentou suic�dio e foi internado em hospital psiqui�trico. Outro fato de conhecimento p�blico e not�rio era o de que ele era pederasta e morreu de SIDA [AIDS] em 1984.� Os apologistas da antipsiquiatria classificam esses argumentos de mesquinhez e alegam que seu passado psiqui�trico e sua �op��o� [SIC] sexual n�o t�m rela��o com o que escreveu. Pensamos que sim, pois ele denegriu v�rios saberes e institutos que salvaguardam os valores morais da sociedade.

4.3. Roger Bastide, soci�logo franc�s de orienta��o estruturalista, em 1967 afirmou: �n�o se � enfermo mental, sen�o em rela��o a uma determinada sociedade� [6]. � o relativismo que caracteriza o pensamento estruturalista: n�o existe certo ou errado, verdade ou erro, tudo depende, tudo � relativo.� Eles confundem a percep��o do fen�meno, que � relativa por ter forte componente subjetivo, com a �coisa em si� ou �n�meno�.

4.4. M�dicos contaminados por essas tend�ncias �psicologizante�, �sociologizante� e �antropologizante� denigrem a pr�pria Medicina: Thomas Szasz, m�dico psicanalista norte americano, recusa o modelo m�dico para as doen�as mentais [Ideologia e Doen�a Mental Ensaios Sobre a Desumaniza��o Psiqui�trica do Homem e El Mito de L�s Enfermidades Mentales];� Ronald Laing e Esterton: Loucura, Gordura e Fam�lia, 1965; Ronald Laing: La pol�tica de la Experiencia, 1967; todos citados por Moreira [7].

4.5. Em 1965, o m�dico ingl�s David Cooper, nascido na �frica do Sul e pertecente ao partido comunista clandestino, juntamente com Ronald Laing, defensor do uso de mescalina e LSD, e Aaron Esterson formaram o movimento antipsiqui�trico internacional. Em 1967, Cooper lan�a o livro contestador e iconoclasta Psychiatry and Anti-Psychiatry, editado pela Tavistock Publication. Esse dados foram colhidos de Roudinesco [8]. A partir desse per�odo fat�dico, a antipsiquiatria passou a ser tema preferido da juventude desajustada, dos portadores de conflitos sociais, mentais, sexuais, dos contestadores contumazes e foi usada como instrumento pol�tico de contesta��o e de desorganiza��o social.� Em maio de 1978, o m�dico italiano, Franco Basaglia, membro do Parido Comunista Italiano [anarquista e gramsciista], conseguiu que o Parlamento de seu pa�s aprovasse a Lei de n� 180 que acabava com os hospitais psiqui�tricos. Em 1987, Roy Porter lan�ou o livro Uma Hist�ria social da Loucura, repetindo a mesma cantilena antipsiqui�trica.

4.6. Podemos asseverar com seguran�a que foi na d�cada de sessenta que se forjou a contra-cultura que caracterizou esse final se s�culo.

5.��� Conseq��ncia da ideologia antipsiqui�trica.

������� 5.1.Ap�s os desvarios das d�cadas de sessenta e de setenta do S�culo XX, a humanidade chegou � de oitenta com uma baixa geral na escala de seus valores morais. A Organiza��o Mundial de Sa�de retirou o diagn�stico de homossexualidade da categoria de pervers�o sexual da Classifica��o Internacional de Doen�as [CID 9 � revis�o, 1975] e a colocou na classifica��o de desajustes sociais. A 10a. Revis�o de 1995 retirou por completo esse diagn�stico admitindo v�rias �op��es� [SIC] sexuais.� No meio de sa�de mental, j� apareceram pervertidos que v�em com certa naturalidade a pr�tica sexual entre seres humanos e animais. Pol�ticos demag�gicos ou degenerados defendem a legaliza��o de casamento entre pervertidos sexuais e, o que � pior, isso j� n�o choca mais as pessoas comuns.� Apresentadora solteira de programas infantis pela televis�o anunciou que se submeteria a insemina��o artificial.� Aparecem criminosos compulsivos, assassinos desvairados que metralham inocentes nas escolas, nos cinemas.� Suic�dios coletivos, liderados por um man�aco, tornam-se rotina. A legaliza��o de drogas j� est� sendo defendida at� por pessoas aparentemente equilibradas, mas sem intelectualidade, que se deixam influenciar por essa contra-cultura.� Os meios de comunica��o s� abordam temas sobre viol�ncia e erotismo.� As religi�es perderam o senso de sacralidade: em vez de levar o povo a Deus, querem levar o Sagrado ao profano com apresenta��es religiosas que se assemelham mais a espet�culo circense do que um ato sagrado.

������ 5.2. Em 13/SET/86, o jornal �O Globo� [Rio-RJ], publicou uma senten�a proferida pelo Juiz Titular da 37 � Vara Criminal do Rio de Janeiro, Dr. S�rgio Verani, em que afirma a falibilidade do diagn�stico psiqui�trico, baseado no livro �Psiquiatria e Antipsiquiatria� de David Cooper, contrariando o diagn�stico e parecer de dois eminentes psiquiatras, Dr. Talvane Marins maia e Dra. Alva Coeli.� Quando o saber jur�dico contesta o saber psiqui�trico em obra de duvidosa seriedade cient�fica, envolvida com o anarco-comunismo e os movimentos contestadores da contra-cultura � porque tudo j� est� perdido. S� resta a f� em um Deus misericordioso que n�o permitir� que o mal dure sempre. AMEM!

6.     A lei Paulo Delgado. A apresenta��o do projeto j� encerrava mal�cia, pois usava para os estabelecimentos psiqui�tricos a palavra pejorativa �manic�mio�.� H� muito tempo, j� � usado o termo �hospital psiqui�trico� e j� havia uma tend�ncia a extinguir n�o s� esse, como os outros estabelecimentos de sa�de que tratassem apenas um quadro cl�nico, como os sanat�rios de tuberculosos, de hansen�acos, etc.. A orienta��o era construir hospitais gerais a fim de que o doente pudesse ser atendido nas intercorr�ncias de outras �reas.� Al�m disso, o avan�o da bioqu�mica veio curar muitas doen�as mentais ou torn�-las suscet�veis a controle.� Foi a qu�mica e n�o a psicologia, a sociologia, a psican�lise ou a pol�tica, respons�vel pela humaniza��o do tratamento psiqui�trico e a redu��o da necessidade de interna��o. A aprova��o dessa lei mostraria uma postura no m�nimo demag�gica, se n�o fosse deliberadamente subversiva, anarquista, corrosiva.� A sociedade brasileira enfrentaria os mesmos problemas ocorridos na It�lia a partir de 1979: os ricos iam para Su��a ou Fran�a internar seus doentes, os pobres tinham que sobreviver � amea�a de seus parentes insanos.�

7.     Conclus�o. Se esse projeto original tivesse sido aprovado, a sociedade brasileira enfrentaria os mesmos problemas ocorridos na It�lia a partir de 1979: os ricos iam para Su��a ou Fran�a internar seus doentes, os pobres tinham que sobreviver � amea�a de seus parentes insanos.� Esse � o caos almejado pela esquerda anarquista, seguindo seu lema � QUANTO PIOR, MELHOR.� Pessoas assustadas falam em fim de mundo. Achamos que j� estamos vivenciando os tempos apocal�pticos. N�o somos m�stico e n�o professamos ocultismo, mas a crise moral causa tamanho desespero que nos for�a a pensar de modo m�gico. A famosa besta apocal�ptica, t�o enigm�tica, nada mais � do que o aniquilamento moral que a contra-cultura dos anos sessenta nos deixou como heran�a. Talvez haja at� uma rela��o cabal�stica entre o n�mero 666 e a d�cada de 60. Seu n�mero, 666 [Apocalipse 13:18], � uma s�rie constitu�da pela repeti��o, tr�s vezes, do algarismo �6�.� A d�cada de 60 [1961/1970] tem nove vezes o algarismo �6� repetido. Nove � o triplo de tr�s. A d�cada de 60 � o triplo da besta apocal�ptica.� Que os m�sticos da Nova Era [New Age] reflitam sobre isso.

 

Refer�ncias Bibliogr�ficas

1] Dicion�rio de Psican�lise; Roudinesco, E. e Plon, M.;� Rio de Janeiro; Jorge Zahar Editor; 1998.

2]� Dicion�rio B�sico de Filosofia; Japiassu, H e Souza Filho, D. M.; 1A. Ed.; Rio de Janeiro; Jorge Zahar Editor; 1990.

3]� Moreira, M.S.; Not�cias Psiqui�tricas[Set/90, N� 198]; Rio de Janeiro; Associa��o Psiqui�trica do Estado do Rio de Janeiro. p. 4.

4] Chaves, V.L.S.; Falando de Psiquiatria [OMBRO A OMBRO� ANO XII,� Mar�o de 2000]; Rio de Janeiro; Estandarte Editora e Empreendimentos CulturaisLtda;; .pg. 10.

5] Dosse, F.; Hist�ria do Estruturalismo, v.1. o campo do signo,1945-1966; S�o Paulo; Ensaio;Campinas, SP; Editora da Universidade Estadual de Campinas; 1993.

6]� Moreira, M.S.; idem, p 4.

7]� Moreira, M.S.; ibidem, p. 2.

8] Dicion�rio de Psican�lise; Roudinesco, E. e Plon, M.;� idem.