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O que os ga�chos dizem de Cuba

 

I

CUBA VIRA TEMA DE CAMPANHA DO PPB
CINCO MILITANTES DA SIGLA VISITARAM A ILHA DE FIDEL POR CINCO DIAS

Zero Hora, Porto Alegre (RS), 9 de agosto de 2001

Com o lema "A Juventude do PPB Adverte: N�o Deixe o Rio Grande Virar Cuba" estampado nas camisetas, cinco integrantes do partido retornaram sexta-feira a Porto Alegre, trazendo na bagagem documentos, grava��es e fotos do que consideram a verdadeira imagem da ilha.

Durante a viagem, os progressistas abriram a bandeira do Rio Grande do Sul na Pra�a da Revolu��o, em frente � sede do governo de Fidel Castro, sob os olhares atentos dos policiais de Havana.

O plano de responder ao hasteamento da bandeira de Cuba no Pal�cio Piratini, no dia da posse de Ol�vio Dutra, em 1999, segundo os jovens, n�o p�de ser concretizado da forma como imaginavam.

� Quer�amos subir na torre do pal�cio do governo e hastear a bandeira l� em cima, mas os guardas nos barraram. O jeito foi abrir a bandeira na pra�a mesmo, com medo de os policiais nos prenderem � relata Jos� Henrique Westphalen, 21 anos, coordenador da comitiva.

A viagem de cinco dias n�o cumpriu o roteiro original. Jos� Henrique Westphalen, Luciano Anziliero, Marcelo Demolinier, Rog�rio Soliman e S�lvio Comanduli n�o conseguiram conhecer as universidades cubanas, em f�rias, nem os hospitais, porque n�o tinham autoriza��o do governo. Apesar disso, trouxeram relatos de cubanos sobre a educa��o e a sa�de no pa�s de Fidel.

� As crian�as est�o desestimuladas com o estudo. Eles passam anos estudando medicina para receber um sal�rio de US$ 7 depois de formados. E, mesmo que haja atendimento m�dico gratuito para todo mundo, os rem�dios receitados nunca s�o encontrados nas farm�cias do governo � diz Westphalen.

A comitiva passou quatro dias em Havana, no Hotel Saint Jones, um estabelecimento tr�s estrelas localizado no bairro El Vedado. As constru��es malconservadas do in�cio do s�culo passado, onde casas de uma s� pe�a servem de moradia para fam�lias de at� nove pessoas, surpreenderam os visitantes.

� Sei que, em alguns lugares do Brasil, a situa��o � parecida. S� que aqui a gente pode mudar de vida, estudando. L�, n�o � compara Westphalen.

Depois de pagar US$ 56 por pessoa, os progressistas conseguiram rumar para Varadero, balne�rio paradis�aco onde os nativos s� podem entrar com autoriza��o oficial.

� L� � outro mundo. Muitos d�lares, carros importados, grande investimento estrangeiro em hot�is de luxo. Os cubanos que vivem em Varadero nunca sa�ram de l�. E os que encontramos em Havana nunca conheceram a praia.

Os progressistas gravaram conversas em bares do Malec�n � avenida � beira-mar em Havana �, regadas a cervejas oferecidas aos cubanos, tiraram fotografias em preto-e-branco dos pr�dios antigos e compraram uma libreta por US$ 5 de um rapaz que pedia dinheiro aos turistas. No documento, o governo cubano marca a quantidade de alimentos e outros produtos distribu�dos � popula��o.

� Quem n�o tem a libreta fica sem comida � diz Westphalen.

No terceiro dia em Havana, os cinco jovens j� queriam retornar a Porto Alegre e come�ar uma campanha pelo Interior para denunciar o que acham que o PT pode fazer com o Estado. Para a comitiva, as posi��es do partido no Rio Grande do Sul s�o semelhantes ao modelo de governo da ilha.�

 

A F� CONTRA A MIS�RIA
Percival Puggina, arquiteto

Correio do Povo, Porto Alegre, 26 de julho de 2001

Acabo de retornar de Cuba, onde passei sete dias. Esperava encontrar um povo homogeneamente pobre e o encontrei t�o carente quanto se pode ser quando o sal�rio da popula��o ativa oscila entre 7 e 25 d�lares. Os corti�os que dominam a �rea de Habana Vieja denotam mis�ria e apenas o fort�ssimo policiamento ostensivo concede tranq�ilidade aos turistas. A antiga libreta - ap�s a sa�da dos russos, suspendendo tr�s d�cadas de patroc�nio - est� reduzida a uma ra��o mensal de arroz, feij�o, a��car, leite em p�, meio quilo de carne de porco e quatro ovos. O resto h� que buscar "en la calIe" com d�lares. E os estrangeiros, fonte mais prov�vel desses d�lares, s�o permanentemente assediados por supostos guias tur�sticos, [agenciadores de prostitutas] e uma verdadeira multid�o de prostitutas.

H� um r�gido controle do Estado sobre a vida dos cidad�os. Em cada quarteir�o opera um Comit� de Defesa da Revolu��o, cujo respons�vel, conforme me informou algu�m, "conoce hasta el color del calzoncillo de mi padre". Os cubanos n�o se podem hospedar em hot�is destinados a turistas nem freq�entar os melhores locais a estes reservados, n�o podem ter TV a cabo nem acessar a Internet. Os jornais - Granma e Juventud Rebelde - s� contam boas not�cias do regime e o que ocorre de ruim no resto do mundo.

Tive curiosidade de saber porque, com tais sal�rios, nem todos vivem como os que habitam os corti�os que se espalham pela cidade. E fui informado de que a diferen�a se deve ao fato de que h� fam�lias cubanas com f� e outras sem f�. "Todo seria mucho peor si no hubiera tanta gente com fe", arrematou meu interlocutor com olhar matreiro. Sorri sem entender, e ele indagou:

— Sab�s lo que es fe? Fe es la sigla local para �familiar en los Estados Unidos�...

 

�CUBA, O INFERNO NO PARA�SO
Juremir Machado da Silva

Correio do Povo, Porto Alegre (RS), 4 de mar�o de 2001

Na cr�nica da semana passada, tentei, pela mil�sima vez, aderir ao comunismo. Usei todos os chav�es que conhecia para justificar o projeto cubano. N�o deu certo. Depois de 11 dias na ilha de Fidel Castro, entreguei de novos os pontos.

O problema do socialismo � sempre o real. Est� certo que as utopias s�o virtuais, o n�o-lugar, mas tanto problema com a realidade inviabiliza qualquer ades�o. Volto chocado: Cuba � uma favela no para�so caribenho.

N�o fiquei trancando no mundo cinco estrelas do hotel Habana Libre. Fui para a rua. Vi, ouvi e me estarreci. Em 42 anos, Fidel construiu o inferno ao alcance de todos. Em Cuba, at� os m�dicos s�o miser�veis. Ningu�m pode queixar-se de discrimina��o. � ainda pior. Os cubanos gostam de uma f�rmula cristalina: 'Cuba tem 11 milh�es de habitantes e 5 milh�es de policiais'. Um policial pode ganhar at� quatro vezes mais do que um m�dico, cujo sal�rio anda em torno de 15 d�lares mensais. Jos�, professor de Hist�ria, e Marcela, sua companheira, moram num corti�o, no Centro de Havana, com mais dez pessoas (em outros chega a 30). N�o h� mais �gua encanada. Calorosos e necessitados de tudo, querem ser ouvidos. Jos� tem o dom da s�ntese: 'Cuba � uma pris�o, um c�rcere especial. Aqui j� se nasce prisioneiro. E a pena � perp�tua. N�o podemos viajar e somos vigiados em perman�ncia. Tenho uma vida tripla: nas aulas, minto para os alunos. Fa�o a apologia da revolu��o. Fora, sei que vivo um pesadelo. Al�vio � arranjar d�lares com turistas'. Jos� e Marcela, Ariel e Julia, Paco e Adelaida, entre tantos com quem falamos,pedem tudo: sab�o, roupas, livros, dinheiro, papel higi�nico, absorventes. Como n�o podem entrar sozinhos nos hot�is de luxo que dominam Havana, quando convidados por turistas, n�o perdem tempo: enchem os bolsos de envelopes de a��car. O sistema de livreta, pelo qual os cubanos recebem do governo uma esp�cie de cesta b�sica, garante comida para uma semana. Depois, cada um que se vire. Carne � um produto impens�vel.

Jos� e Marcela, ainda assim, quiseram mostrar a casa e servir um almo�o de domingo: arroz, feij�o e alguns peda�os de f�gado de boi. Uma festa. Culpa do embargo norte-americano? Resultado da queda do Leste Europeu? Jos� n�o vacila: 'Para quem tem d�lares n�o h� embargo. A crise do Leste trouxe um agravamento da situa��o econ�mica. Mas, se Cuba � uma ditadura, isso nada tem a ver com o bloqueio'. Cuba tem quatro classes sociais: os altos funcion�rios do Estado, confortavelmente instalados em Miramar; os militares e os policiais; os empregados de hotel (que recebem gorjetas em d�lar); e o povo. 'Para ter um emprego num hotel � preciso ser filho de papai, ser protegido de um grande, ter influ�ncia', explica Ricardo, engenheiro que virou mec�nico e gostaria de ser mensageiro nos hot�is luxuosos de redes internacionais.

Certa noite, numa roda de novos amigos, brinco que,quando visito um pa�s problem�tico, o regime cai logo depois da minha sa�da. Respondem em un�ssono:

Vamos te expulsar daqui agora mesmo'. Pergunto por que n�o se rebelam, n�o protestam, n�o matam Fidel? Explicam que foram educados para o medo, vivem num Estado totalit�rio, n�o t�m um l�der de oposi��o e n�o saberiam atacar com pedras, � moda palestina. Prometem, no embalo das piadas, substituir todas as fotos de Che Guevara espalhadas pela ilha por uma minha se eu assassinar Fidel para eles.

Quero explica��es, defini��es, mais luz. Resumem: 'Cuba � uma ditadura'. Pe�o demonstra��es: 'Aqui n�o existem elei��es. A democracia participativa, direta, popular, � um fachada para a manipula��o. N�o temos campanhas eleitorais, s� temos um partido, um jornal, dois canais de televis�o, de propaganda, e, se fiz�ssemos um discurso em pra�a p�blica para criticar o governo, ser�amos presos na hora'.

Ricardo Alarc�n aparece na televis�o para dizer que o sistema eleitoral de Cuba � o mais democr�tico do mundo. Os telespectadores riem: '� o bra�o direito da ditadura. O partido indica o candidato a delegado de um distrito; cabe aos moradores do lugar confirm�-lo; a partir da�, o povo n�o interfere em mais nada. Os delegados confirmam os deputados; estes, o Conselho de Estado; que consagra Fidel'.Mas e a educa��o e a sa�de para todos? Ariel explica: 'Temos alfabetiza��o e profissionaliza��o para todos, n�o educa��o. Somos formados para ler a vers�o oficial, n�o para a liberdade.

A educa��o s� existe para a consci�ncia cr�tica, � qual n�o temos direito. O sistema de sa�de � bom e garante que vivamos mais tempo para a submiss�o'.Jos� mostra-me as prostitutas, d� os pre�os e diz que ningu�m as condena:'Est�o ajudando as fam�lias a sobreviver'. Por uma de 15 anos, estudante e bonita, 80 d�lares. Quatro velhas negras olham uma televis�o em preto e branco, cuja imagem n�o se fixa. Tentam ver 'For�a de um Desejo'. Uma delas justifica: 'S� temos a macumba (santer�a) e as novelas como alento. Fidel j� nos tirou tudo.Tomara que nos deixe as novelas brasileiras'. Antes da partida,Jos� exige que eu me comprometa a ter coragem de, ao chegar ao Brasil, contar a verdade que me ensinaram: em Cuba s� h� 'rumvoltados'.

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