Leituras recomendadas 149
A Função Social do Empresário
Por Alceu Garcia
No primeiro episódio, Cristaldo relata a alegria dos habitantes do povoado gaúcho em que nasceu e vivia quando dois mascates de origem turca apareciam por aquelas paragens, montados em bicicletas atulhadas de traquitanas inexistentes na localidade.
No outro "causo", o escritor conta suas
infrutíferas peripécias para conseguir beber cerveja
em um movimentado balneário na Romênia comunista. Praia
cheia, sol à pino, o sedento Cristaldo dirige-se a um
quiosque próximo em busca do precioso líquido para
molhar a garganta. O barraqueiro público – pois tudo
era estatal na Romênia -, porém, frustra o turista
brasileiro ao informar que não dispunha de cerveja.
Refrigerante? Não A badalada praia romena, em que não havia nada para comprar, e o obscuro rincão gaúcho, onde havia, simbolizam duas ordens sociais radicalmente diferentes: na primeira, a função empresarial é proscrita; na segunda ela é permitida. Em suma, uma é socialista e a outra é capitalista. O socialismo presume que a atividade empresarial, que se funda na propriedade privada e nas trocas voluntárias, é a priori nefasta e espoliadora. O empresário (ou capitalista burguês, na terminologia de Marx) é um parasita cuja erradicação é um imperativo de justiça social. A supressão da propriedade privada e do motivo do lucro são condições sine qua non para que o egoísmo execrável seja banido da face da Terra e uma nova era de solidariedade e humanismo seja inaugurada. É claro que nada disso aconteceu onde essas idéias "brilhantes" foram levadas às suas últimas consequências, muito pelo contrário. E não havia nada para comprar nas barracas públicas das praias nem em lugar nenhum. Porquê?
A resposta é simples: onde a função empresarial
é proibida, a escassez artificial de tudo está
garantida. Mas que raio de função é essa
afinal? Malgrado sua importância fundamental pareça
instintivamente evidente aos leigos, é lastimável
constatar que o que é ensinado sob o rótulo de
Economia nas universidades, com raras exceções,
raramente ou nunca aborda Quem procura embasamento teórico sobre esse assunto vital tem que estudar os obscuros economistas da Escola Austríaca, como L. von Mises, F. Hayek (esse ao menos ganhou o Nobel), M. Rothbard e Israel Kirzner, cujas teorias não são ventiladas nos centros acadêmicos. Mas não é difícil entender o conceito e correlacioná-lo com a realidade circundante. Como vivemos um um mundo imperfeito, em que o futuro é incerto e as nformações de que cada um dispõe sobre o que se passa ao redor são sempre incompletas e fragmentadas, a verdade é que somos todos de certa forma empresários. Isso mesmo, leitor! Se você é socialista, sinto muito; só lhe resta cometer suicídio pelo bem do "proletariado".
Cada indivíduo traça seus planos à luz de
objetivos de qualquer Assim é a vida.
No plano mais restrito da economia, empresário é
basicamente aquele que compra barato para vender mais caro,
fenômeno denominado no jargão econômico de
arbitragem. Isso vale tanto para o comerciante que compra a
mercadoria pronta do produtor para revendê-la ao consumidor,
quanto para o
As oportunidades de obter lucro satisfazendo os desejos dos
No episódio da infância de Janer Cristaldo, os tais
comerciantes
E o que ocorre quando a função empresarial é
proibida tout court sob pena de prisão, como nos regimes
coletivistas, ou gravemente turbada e obstruída, como em
economias mercantilistas tipo a brasileira? Ocorre o que Cristaldo
testemunhou na Romênia e o que presenciamos diariamente em
Mas em países como o Brasil a função
empresarial é estorvada de mil formas pelo Estado, sobretudo
entre os mais pobres, o que resulta em pobreza desnecessária
(e, logo, imoral). O economista peruano Hernando de Soto vem
pesquisando há anos os processos pelos quais os governos
embaraçam os Para variar, é o Estado e os grupos – sobretudo os intelectuais - que se servem dele para explorar os incautos, o culpado por essa situação. O governo é uma espécie de Midas ao avesso, pois onde quer que se meta a atuar na economia, proibindo no todo ou em parte a função empresarial, transforma abundância potencial e maximização da satisfação individual em escassez e insatisfação permanentes. Quem se preocupa sinceramente com a dolorosa pobreza de grande parte dos brasileiros deve lutar para que a função empresarial seja desonerada e libertada das cadeias estatais. Não há outra saída. |