Leituras recomendadas 84
Os "sem justi�a"
S�rgio da Costa Franco
..."Lembramos especialmente todos os propriet�rios de
resid�ncias praianas, resid�ncias que ficam desocupadas e sem
utilidade desde mar�o a dezembro. Se invadidos tais pr�dios
pelos "sem teto", o magistrado relutaria em conceder
reintegra��o de posse aos respectivos possuidores"...
...."Diante desse extremismo que derroga e revoga o direito
de propriedade, tremam todos quantos possuam resid�ncias
muito espa�osas, excesso de dormit�rios, de banheiros ou de
garagens. Ai do cidad�o que apenas cuidar de seus interesses
e dos de sua fam�lia! Todos n�s teremos que ser ap�stolos da
igualdade, distribuindo os frutos de nosso trabalho a todos
quantos nos rondarem a porta empunhando bandeiras vermelhas
e gritando preg�es revolucion�rios"...
Ao numeroso elenco dos desprotegidos sociais -- os "sem terra", os "sem casa", os "sem vaga hospitalar" e os sem emprego --, somam-se agora os "sem justi�a". � �bvia a refer�ncia a esse titular de posse mansa e pac�fica (e de dom�nio) que, em batendo �s portas do Judici�rio para obter a restitui��o de sua gleba, usurpada por invasores, recebeu como despacho a exig�ncia de comprovar que sua propriedade � produtiva. Pela primeira vez na hist�ria do Direito possess�rio, a posse obtida pela for�a prevalece sobre a mansa e pac�fica, al�m do mais amparada em t�tulos de dom�nio. A prote��o da posse pelo C�digo Civil vai ao ponto de permitir o desfor�o f�sico incontinenti, para enfrentar e expulsar o esbulhador (art. 502). Entretanto, para evitar o desfor�o, de imprevis�veis conseq��ncias, a lei concede o rem�dio da reintegra��o liminar. Mas eis que surgem ju�zes que se permitem premiar o esbulhador e sujeitar o esbulhado �s dila��es probat�rias e � morosidade da a��o ordin�ria. Em nome de qu�? Em nome da fun��o social da propriedade e da produtividade rural, mat�ria que s� interessa rigorosamente ao governo, como preliminar de suas a��es de desapropria��o. Descumprem-se regras expl�citas da lei e princ�pios universais de Direito, fazendo-se ao possuidor exig�ncias jamais previstas para a legitima��o do seu direito de agir. Cabe lembrar que a prote��o da posse n�o diz respeito apenas ao propriet�rio. Possuidores podem ser o arrendat�rio, o usufrutu�rio, o cession�rio de direitos, entre outros. Posse � fato. � o exerc�cio de algum dos poderes inerentes ao dom�nio. E n�o se trata de nenhum privil�gio concedido a latifundi�rios. � justamente a prote��o possess�ria que vai em socorro do agricultor pobre, arrendat�rio ou parceiro, quando amea�ado de expuls�o sum�ria pelo titular do dom�nio. A possess�ria tutela as situa��es de fato, protegendo os produtores, o trabalho, a morada habitual, contra todos quantos pretendam turbar as situa��es licitamente adquiridas. Por outro lado, � bem clara a lei de que n�o autorizam a aquisi��o da posse os atos violentos ou clandestinos?. E a posse velha prevalece sobre a nova, a titulada sobre a desprovida de t�tulo. Todos os cap�tulos que tratam da posse, no C�digo Civil de 1916, s�o de uma limpidez incontest�vel, n�o dando lugar � previs�o de grandes mudan�as legislativas. Mesmo sem conhecer o texto do novo c�digo, j� sancionado, � de se duvidar que, em mat�ria de disciplina da posse, tenham ocorrido altera��es maiores. A baixa produtividade de uma gleba pode ser fundamento para a desapropria��o por utilidade social, mediante pr�via e justa indeniza��o. N�o se considere, entretanto, a produtividade como requisito para a prote��o judicial contra esbulhadores criminosos. E a negativa de reintegra��o, sob o argumento de que n�o foi comprovada a produtividade, vem at� a caracterizar desapropria��o indireta, sujeitando o Estado a indenizar o propriet�rio usurpado, com todos os acess�rios da "restitutio in integrum". A tese acolhida pelo magistrado de Passo Fundo deixa sumamente inseguros n�o s� os propriet�rios rurais, os homens do campo e da lavoura, cuja capacidade de produzir pode oscilar em fun��o da falta de cr�dito, das epizootias e dos eventos da natureza. Lembramos especialmente todos os propriet�rios de resid�ncias praianas, resid�ncias que ficam desocupadas e sem utilidade desde mar�o a dezembro. Se invadidos tais pr�dios pelos "sem teto", o magistrado relutaria em conceder reintegra��o de posse aos respectivos possuidores. Ou s� lhes concederia no in�cio do ver�o. A solu��o parece aberrante e injusta, mas est� exatamente em coer�ncia com a linha de pensamento daquele julgador, que escreveu em seu despacho, segundo se l� em Zero Hora de 23 de outubro: "Para algu�m exigir a tutela judicial da prote��o a sua posse ou propriedade, precisa fazer prova adequada de que esteja usando ou gozando desse bem "secundum beneficium societatis", ou seja, de acordo com os interesses da sociedade e n�o apenas seus pr�prios interesses ou de sua fam�lia". Diante desse extremismo que derroga e revoga o direito de propriedade, tremam todos quantos possuam resid�ncias muito espa�osas, excesso de dormit�rios, de banheiros ou de garagens. Ai do cidad�o que apenas cuidar de seus interesses e dos de sua fam�lia! Todos n�s teremos que ser ap�stolos da igualdade, distribuindo os frutos de nosso trabalho a todos quantos nos rondarem a porta empunhando bandeiras vermelhas e gritando preg�es revolucion�rios. Sempre nutrimos respeito pelas decis�es da Justi�a, quando amparadas na lei e nos princ�pios gerais de Direito. Por�m entendemos que s�o pass�veis de discuss�o e de cr�tica, dentro e fora dos processos, as decis�es que atropelam a lei e a ordem p�blica. Em nome de um construtivismo jur�dico que desrespeita a independ�ncia dos poderes e que sobrep�e ao imp�rio da norma a vontade e as id�ias do magistrado, tem surgido toda uma corrente de ju�zes ditos "alternativos", que seguramente n�o concorrem para a consolida��o do Estado de Direito. Quando a linguagem dos tribunais resvala para o discurso demag�gico dos com�cios e quando o julgador se arvora despoticamente em legislador, sem voto e sem mandato, o Estado de Direito est� realmente em perigo.
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